FGV: Emissões da pecuária brasileira podem cair pelo menos 79,9% até 2050

Queda pode chegar a 92,6% se, além dos investimentos em produtividade, for acelerada a implementação de soluções para a pecuária de baixo carbono

Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), concluiu que a pecuária brasileira vai reduzir em pelo menos 79,9% as emissões de CO2 na produção de carne se mantiver o ritmo atual de adoção de práticas mais eficientes de criação e de conversão de novas áreas para pastagem, chegando a 92,6% nos cenários mais otimistas.

Divulgado na COP30, em Belém (PA), o levantamento mostrou que, mesmo com o crescimento da produção, as emissões líquidas, ou seja, as emissões menos as remoções, tendem a cair até 2050: 60,7% no cenário de continuidade das tendências atuais; e até a 85,4% no mais otimista.

“Nosso objetivo foi compreender o papel da pecuária brasileira na agenda climática e identificar onde estão as maiores oportunidades de mitigação”, afirmou Camila Estevam, pesquisadora no FGV Agro. “Os resultados indicam que o setor tem condições de ampliar sua produção e, ao mesmo tempo, avançar em uma trajetória consistente de descarbonização, atuando como aliado da agenda climática.”

Para calcular o potencial de descarbonização, o estudo analisou quatro cenários. O primeiro simulou a continuidade das tendências de uso da terra e aumento da produtividade, práticas que já existem. Desde 1990, a pecuária brasileira aumentou em 183% a produtividade, ao mesmo tempo em que reduziu a área ocupada por pastagens em 18%, segundo a ABIEC. Se for mantido esse ritmo, as emissões por quilo de carne serão reduzidas de 80 quilos de CO2 para 16,1 quilos, uma queda de 79,9%.

O segundo cenário considera o cumprimento da meta do governo de zerar o desmatamento até 2030, o que permitiria uma redução de 86,3% nas emissões por quilo de proteína animal produzida. A terceira projeção adiciona a adoção integral do Plano ABC+ (Plano Setorial para Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária), com foco na recuperação de pastagens degradadas e na expansão de sistemas integrados, como o de lavoura e pecuária, em que a descarbonização chega a 91,6%.

Já o quarto incorpora os itens anteriores e o uso de técnicas como aditivos alimentares para redução de fermentação entérica e o abate precoce, como motores de eficiência. Nesse cenário, a queda chegaria a 92,6%.

“O resultado potencial de redução de 92,6% nas emissões por quilo de proteína produzida pode ser alcançado por meio da combinação de metas públicas já estabelecidas, da implementação em escala de tecnologias de ponta, além da expansão das melhores práticas que já vêm sendo aplicadas por alguns dos mais relevantes produtores nacionais. Isso confirma o papel da pecuária como um pilar essencial para o cumprimento das metas climáticas do Brasil”, afirma Guilherme Bastos, coordenador do FGV Agro.

O papel das políticas públicas

O cenário mais avançado de descarbonização depende da aplicação de políticas públicas relevantes, que têm o papel de funcionar como alavanca e balizador da ação produtiva. Uma das questões essenciais apontadas pelo estudo é o fim da ilegalidade e o alcance da meta de desmatamento zero até 2030, algo que irá exigir a participação do setor produtivo.

Para esse cenário se concretizar, será preciso colocar em prática os planos de prevenção e combate ao desmatamento, e políticas públicas de rastreabilidade como o Plano Nacional de Identificação de Bovinos, o PNIB, e a plataforma AgroBrasil+Sustentável, ambas do Ministério da Agricultura,além de iniciativas estaduais como o Selo Verde e o Programa de Integridade da Pecuária do Pará.

Em segundo lugar, o governo deve criar mecanismos de incentivo e financiamento para acelerar a adoção das práticas do Plano ABC+ e das tecnologias mais avançadas, garantindo que o investimento na conservação e na recuperação de pastagens degradadas seja economicamente viável para o produtor rural.

“A pecuária brasileira tem um papel central na agenda climática e um enorme potencial para contribuir com a descarbonização, liberando espaço nas metas do Brasil em relação ao Acordo de Paris”, diz Roberto Perosa, presidente da ABIEC. “Isso é motivo de muito orgulho, mas também aumenta ainda mais a nossa responsabilidade, pois precisamos continuar a acelerar o caminho que já estamos percorrendo.”