De Goldman a Morgan Stanley investem para ampliar acesso de investidor a startups

Bancos e empresas como Charles Schwab avançam em território de fundos de venture capital ao comprar techs novatas e plataformas de negociação secundária em startups, para facilitar aportes de investidores em empresas de capital fechado

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Bloomberg — Em poucas semanas, alguns dos maiores bancos de Wall Street fincaram posição em um território historicamente dominado pelo venture capital.

Primeiro, o Goldman Sachs concordou em comprar a Industry Ventures, empresa que tem participações em 800 fundos de capital de risco. Semanas depois, o Morgan Stanley fechou um acordo para adquirir a EquityZen, uma plataforma de negociação de ações de empresas privadas. A Charles Schwab veio em seguida, comprando a Forge Global Holdings, concorrente da EquityZen.

O trio de aquisições vai fornecer fluxo de negócios, dados e relacionamentos com startups de rápido crescimento a instituições que tradicionalmente se concentram em companhias listadas em bolsa. Mas também abrirá aos clientes um caminho para driblar os fundos de venture capital.

Em vez de desembolsar recursos para se tornar investidor (ou limited partner) de um fundo de VC ou aplicar em um “fundo de continuação”, no qual a gestora vende parte do capital e dá aos sócios a chance de sair, investidores poderão usar essas plataformas para fazer apostas menores e mais direcionadas.

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Para as empresas de venture capital, esse movimento pode ameaçar um modelo de negócios de longa data. Com mais opções para negociar ações no mercado secundário e algo parecido a um mercado que ajude a definir valuations, as gestoras podem enfrentar dificuldades para justificar sua atual estrutura de taxas.

A maioria cobra cerca de 2% ao ano sobre o capital sob gestão, além de aproximadamente 20% dos lucros do fundo — modelo conhecido como 2 e 20.

As taxas são relativamente altas em comparação com outros serviços de gestão de patrimônio ou investimentos e ajudam a compensar os riscos assumidos pelos VCs ao apostar em empresas em estágio inicial, a maioria das quais não dá retorno.

“Veremos as taxas do venture capital se dividirem drasticamente ao longo do tempo”, disse Javier Avalos, CEO da Caplight, uma plataforma de negociação secundária.

“Imagine que um investidor de alta renda consiga acessar diretamente, pela própria corretora, empresas de capital fechado inovadoras e já maduras, pagando apenas uma taxa nominal. Por que ele pagaria 2 e 20 para entrar em um fundo de ‘blind pool’ e torcer para que esse fundo consiga investir nas mesmas dez ou vinte empresas mais desejadas?”

EquityZen e Forge permitem que investidores qualificados e pessoas de alta renda comprem e vendam participações em empresas de capital fechado, espelhando o funcionamento de uma bolsa de valores tradicional.

Com elas, Morgan Stanley e Charles Schwab poderão oferecer mais serviços a acionistas de empresas fechadas. A Industry Ventures dará ao Goldman acesso a informações sobre as empresas que mais despertam interesse dos investidores.

Essas operações exploram uma mudança relevante no cenário de investimentos. Startups têm permanecido fechadas por mais tempo, o que tem mantido algumas das empresas mais interessantes longe dos mercados públicos e impedido que investidores iniciais e funcionários realizem seus ganhos.

Ao mesmo tempo, os valuations crescentes de empresas de capital fechado de tecnologia — como a gigante de inteligência artificial OpenAI — vêm estimulando a demanda por suas ações restritas por parte de um número maior de investidores.

“Desde o anúncio da aquisição, temos recebido muitas consultas de toda nossa base global de clientes, porque é difícil conseguir acesso a venture capital de alta qualidade”, disse Michael Brandmeyer, diretor de investimentos do grupo de investimentos externos da Goldman Sachs Asset Management, divisão que abrigará a Industry Ventures quando o negócio for concluído.

Um porta-voz do Morgan Stanley fez referência ao comunicado de imprensa sobre a compra da EquityZen e preferiu não comentar além disso. Um representante da Charles Schwab não respondeu ao pedido de comentário.

O novo desafio surge em um momento difícil para os VCs. A idade mediana de uma empresa americana no momento de seu IPO chegou a 14 anos em 2024, segundo pesquisa de Jay Ritter, professor da Warrington College of Business da Universidade da Flórida. É o maior nível desde 2009, quando os mercados financeiros globais entraram em colapso durante a crise de crédito, de acordo com seus dados.

À medida que empresas esperam mais tempo para abrir capital, o número de IPOs diminuiu, eliminando uma das principais formas de os fundos de venture capital recuperarem seus investimentos. As firmas americanas de VC registraram perda de cerca de 6,4% nos últimos três anos, segundo um índice de mais de 2.500 gestoras monitorado pela Cambridge Associates.

O mercado secundário vem crescendo de forma constante na última década, e a Industry Ventures prevê que o volume de negociações deve chegar a US$ 122 bilhões em 2025. Para comparação, houve apenas cerca de US$ 21 bilhões em IPOs de tecnologia neste ano, segundo dados compilados pela Bloomberg.

“As áreas de negociação dos bancos vão encontrar maneiras de atuar mais ativamente em empresas privadas”, disse Brandmeyer. “Ainda assim, as empresas mais interessantes continuam muito difíceis de acessar.”

Mesmo assim, Mina Mutafchieva, sócia da HV Capital, afirmou que, embora as plataformas secundárias tenham potencial para democratizar o investimento em empresas privadas, existem riscos ocultos.

Investidores podem ser surpreendidos pela falta de informações em comparação com companhias listadas, que precisam cumprir exigências regulatórias de divulgação de resultados.

Empresas fechadas podem ter estruturas acionárias complexas, que não favorecem quem compra ações no mercado secundário. Os sócios gestores dos VCs — que fazem o trabalho de conhecer a fundo uma startup e orientá-la — oferecem mais segurança aos investidores, disse ela.

“Quando você é um LP [limited partner] que aporta capital em um fundo, sabe que os GPs [general partners] estão investindo junto com você, têm seu próprio capital a perder e são especialistas”, afirmou Mutafchieva. “Quando investe por meio de uma plataforma, você realmente tem visibilidade suficiente para tomar a decisão certa?”

A maioria das empresas de capital fechado também não quer ver suas ações circulando no mercado secundário como ações de empresas listadas e, por isso, impõe restrições para evitar vendas, disse Tom Callahan, CEO da Nasdaq Private Market. A maior parte do crescimento do mercado de empresas de capital fechado deve vir de ofertas lideradas pelas próprias empresas.

“A falta de liquidez das ações privadas é uma característica, não um defeito”, disse ele.

Cada vez mais, empresas fechadas recorrem a essas fontes de capital fora do universo dos VCs porque o volume de recursos buscado por elas supera a disponibilidade dos fundos de venture capital.

É o caso de Revolut e Stripe. Ambas as fintechs ofereceram recentemente ações à unidade de gestão de recursos do Goldman, que as repassou aos clientes mais ricos do banco. É o sinal mais recente de que os VCs terão participações menores em empresas mais maduras daqui para frente e precisarão competir, com mais frequência, com outros investidores — como bancos e gestoras — por influência.

“Concordo que isso vem criando certa tensão nas fases muito tardias, no que diz respeito a quem deve ficar com o valor”, disse Mutafchieva. “No fim das contas, nosso jogo é estar lá o mais cedo possível.”

Avalos, da Caplight, vai ainda mais longe.

Fundos de venture capital em estágio avançado devem se parecer mais com “a compra de um índice das empresas de capital fechado de melhor desempenho e cobrar algo mais próximo do que cobram os gestores passivos no mercado público”, disse ele.

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