Novo CEO da Diageo traz na bagagem uma receita de sucesso em processos de turnaround

Dave Lewis foi nomeado CEO da Diageo e assume o cargo em um momento crítico para a empresa, que precisa se destacar em um mercado que enfrenta mudanças nos hábitos de consumo e consumidores com menos dinheiro

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Bloomberg Opinion — Dave Lewis ganhou o apelido de “Drastic Dave” pelas drásticas reduções de custos que implementou quando era executivo sênior da Unilever. Ele precisará de todas as medidas mais radicais de seu arsenal corporativo para reviver a sorte da Diageo, proprietária das marcas Johnnie Walker, Smirnoff e Guinness, onde acaba de ser nomeado CEO, superando o favorito, o CFO Nik Jhangiani, para o cargo mais alto.

Lewis enfrenta um turnaround difícil. Os desafios da Diageo — como reativar o crescimento em um mercado que enfrenta mudanças nos hábitos de consumo de bebidas alcoólicas e consumidores com menos poder aquisitivo — afetam toda a indústria de bebidas alcoólicas, não apenas a Diageo.

Mas ele tem uma grande vantagem sobre sua antecessora, Debra Crew: terá liberdade para fazer mudanças. Crew foi prejudicada por assumir o cargo antes do planejado, em 2023, após a morte de Ivan Menezes, ofuscada pela necessidade de proteger seu legado no topo do mercado de bebidas alcoólicas.

Lewis é uma escolha sólida para CEO e uma aposta segura. Ele realizou uma reviravolta (quase) exemplar na rede britânica de supermercados Tesco, quando tirou a empresa da UTI após a descoberta de um rombo nos lucros em 2014.

Ele vendeu divisões não essenciais, focou no negócio de alimentos no Reino Unido, reduziu a dívida e restabeleceu os dividendos. As ações da Diageo encerram em alta de 5,21% na segunda-feira (10), em Londres.

Suas habilidades estratégicas e de redução de custos, bem como a proeza em marketing que demonstrou na Unilever, devem ajudar a Diageo, que também luta contra um aumento da dívida, à medida que o crescimento das vendas e dos lucros desacelerou.

Mas o turnaround é mais complexo do que o da Tesco. A empresa enfrenta a crise após um boom na compra de bebidas alcoólicas, já que as pessoas passaram a preparar drinks em casa em vez de frequentar bares.

Os hábitos de consumo de bebidas estão mudando. Os jovens estão consumindo menos, enquanto os medicamentos para perda de peso, que podem afastar os usuários das bebidas, são outro desafio.

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Ao mesmo tempo, os clientes nos Estados Unidos e na China estão sob pressão econômica. Por fim, os fabricantes de bebidas estão na mira das tarifas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

Mas há algumas medidas rápidas disponíveis para Lewis colocar a Diageo em uma posição mais sólida.

Na semana passada, a empresa reduziu seu guidance de vendas e lucros para o ano completo. Se sua estratégia na Tesco servir de referência, sua primeira medida provavelmente será a boa e velha “limpeza geral”, tirando todas as más notícias do caminho logo no início e reduzindo as expectativas a um nível que reflita melhor as pressões enfrentadas pelo setor.

Embora isso possa prejudicar o preço das ações inicialmente, proporcionará a Lewis uma plataforma a partir da qual poderá construir. Isso inclui restaurar o moral da empresa após alguns anos tumultuosos e investir nas suas marcas, que também incluem Gordon’s Gin e a tequila Casamigos, para atrair os consumidores.

E isso não deve se limitar a cortejar os consumidores mais sofisticados, nos quais a Diageo tem focado, mas sim a uma gama mais ampla de clientes.

Lewis também poderia considerar a cisão da Guinness, que pode valer mais de US$ 10 bilhões e que desafiou a queda no consumo de bebidas alcoólicas, em parte graças à tendência do TikTok de “dividir uma Guinness”, levando com precisão o nível do líquido preto a um ponto específico em um copo oficial da marca Guinness.

A Diageo poderia manter uma participação significativa no negócio, enquanto uma listagem independente demonstraria o valor do ativo para os investidores.

Lewis certamente terá muito trabalho pela frente. Embora a Diageo tenha sido um grande fornecedor da Tesco, ele não tem experiência direta no setor de bebidas alcoólicas.

Outro desafio: Lewis deve lidar com as consequências de Jhangiani não ter conseguido o cargo de CEO que ele tanto desejava.

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Sua ambição foi um dos fatores que levaram à demissão de Crew em julho. Jhangiani permanecerá como CEO interino até o final deste ano, quando voltará a ser CFO. É notável que a experiente executiva da Diageo, Deirdre Mahlan, que retornou à empresa como CFO interina, permanecerá para ajudar na transição da gestão.

Mas pelo menos Lewis tem o apoio claro do conselho e não será prejudicado pela bagagem com que Crew teve que lidar. Isso deve automaticamente fazer com que suas ações sejam mais bem aceitas pelos investidores.

Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Andrea Felsted é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre os setores de varejo e bens de consumo. Anteriormente, escrevia para o Financial Times.

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