Opinión - Bloomberg

Por que o ‘acquihiring’ se tornou um problema para investidores de venture capital

Com a guerra por talentos em inteligência artificial, as big techs têm adotado uma estratégia que preocupa fundos de capital de risco, mas também traz oportunidades

San Francisco
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Se você é um investidor de venture capital, seu sonho é apoiar a próxima startup bilionária para um dia se beneficiar dos retornos de uma venda da empresa. Quem seria o comprador nesse caso? Uma gigantesca empresa de tecnologia, é claro.

Mas, atualmente, as big techs estão fazendo o chamado “acquihiring” das empresas de inteligência artificial mais promissoras, para capturar os talentos mais promissores do setor, evitando o escrutínio antitruste. Muitas vezes a startup adquirida deixa para trás as operações comerciais, ou seja, a essência da empresa.

O fenômeno tem sido ótimo para as gigantes da tecnologia, que podem eliminar rivais em potencial de forma mais barata, mas deixou os investidores de venture capital em uma situação difícil, com retornos menores do que esperariam de uma venda tradicional ou mesmo de uma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês).

A forma como eles reagirem pode colocar todo o setor em um caminho diferente e, se tivermos sorte, melhor.

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Uma reação à tendência tem sido reclamar. “Não gosto desse fenômeno”, diz Ali Ojjeh, presidente da Northgate Capital, uma empresa de capital de risco com US$ 5 bilhões em capital comprometido.

Ojjeh foi um dos primeiros investidores pessoais da Inflection AI, cuja equipe de 70 pessoas foi adquirida pela Microsoft (MSFT) no ano passado.

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A Inflection prometeu que seus investidores seriam recompensados, e eles foram, mas com retornos modestos.

O mesmo aconteceu com a Scale AI, quando a Meta Platforms (META) comprou 49% das ações da empresa por US$ 14,3 bilhões e contratou seu CEO, Alexandr Wang, para liderar a nova divisão Superintelligence Labs, de Mark Zuckerberg.

Outro exemplo recente: o Google pagou US$ 2,4 bilhões pela equipe de liderança sênior e pelos direitos de licenciamento da Windsurf, uma assistente de programação de IA.

O “acquihiring” não é novo. Por mais de uma década, grandes empresas de tecnologia como o Google da Alphabet (GOOG), a Microsoft e a Meta normalmente pagavam alguns milhões de dólares para contratar engenheiros talentosos e equipes de produto de pequenas startups em estágio inicial, deixando seus investidores com retornos modestos ou nenhum retorno.

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Mas a corrida da IA generativa impulsionou essa estratégia, começando com o acordo da Microsoft com a Inflection em 2024, e deflacionou os retornos estrondosos com os quais os investidores de venture capital contam para impulsionar seus portfólios.

O chamado power-law model (modelo de lei de potência) do setor de venture capital significa que os retornos para os investidores geralmente vêm de apenas um ou dois sucessos estrondosos, como a Inflection ou a Scale AI.

Mas se uma startup em alta como a Scale recebe um investimento de US$ 14,3 bilhões em vez de uma venda de US$ 29 bilhões em uma aquisição tradicional, a diferença significa que um fundo retorna apenas duas vezes o dinheiro de seus investidores, em vez de quatro vezes.

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O “acquihiring” “atinge as empresas atípicas”, diz Ojjeh. “Isso está favorecendo os fundadores em detrimento dos acionistas e funcionários.”

Os membros do conselho dessas startups estão igualmente encurralados, sem alternativas e, às vezes, preocupados em queimar pontes com os gigantes da tecnologia, para os quais suas startups de maior destaque são os únicos compradores realistas.

E se a tendência do “acquihiring” se tornar permanente? As equipes de fusões e aquisições das gigantes da tecnologia estão, sem dúvida, explorando todos os tipos de acordos híbridos que possam ajudar esse novo manual a continuar funcionando nos próximos anos, principalmente porque os reguladores antitruste não mostram sinais de flexibilização.

Mais “acquihiring” consolidaria ainda mais seu domínio e seriam ruins para o setor. Mas e se, a longo prazo, isso levasse a um mercado mais saudável?

Em vez de pressionar as startups a obter o maior valuation possível para uma venda, os fundos de capital de risco em um mercado de “acquihiring” prefeririam empresas com maior chance de operar um negócio de longo prazo e flutuar nos mercados abertos.

As vendas estratégicas para as grandes empresas de tecnologia sempre ofereceram um prêmio sobre as IPOs, mas quando essas vendas são menos prováveis, abrir o capital se torna a opção mais viável.

Isso poderia colocar os investidores de venture capital em busca de startups com negócios mais sustentáveis, não apenas aquelas com um pitch deck que promete um crescimento exponencial e um mercado total potencial do tamanho do Canadá.

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Isso seria melhor do que a dinâmica do mercado atual. Apesar de todo o dinheiro que o modelo de lei de potência gerou para empresas renomadas como Sequoia Capital e Greylock Ventures, ele levou a uma cascata de resultados negativos para o público e para o mercado em geral.

Os VCs pressionaram as startups a agir rapidamente e quebrar paradigmas, a crescer rapidamente para que pudessem dominar o mercado antes que os concorrentes as alcançassem.

Os custos têm sido altos tanto para o mercado quanto para o público, desde o vício em mídias sociais até trabalhadores mal tratados e o desaparecimento da concorrência, como descreve vividamente o livro The World Eaters, de Catherine Bracy.

De certa forma, as empresas de venture capital causaram essas últimas frustrações a si mesmas ao confiar por tanto tempo em apenas algumas grandes saídas para impulsionar o retorno de seus fundos.

Esse modelo ajudou a ampliar o domínio financeiro das grandes empresas de tecnologia, de modo que quase metade do crescimento dos lucros do S&P 500 em 2025 virá de algumas gigantes da tecnologia.

Mas, às vezes, as ações levam a consequências indesejadas. Em sua busca por fortalecer a supervisão antitruste das grandes empresas de tecnologia, a ex-presidente da Comissão Federal de Comércio, Lina Khan, pode ter inadvertidamente levado as empresas de tecnologia a evitar o escrutínio com apenas mais um tipo de comportamento anticompetitivo.

No entanto, embora a nova tendência de aquisição de talentos possa ser ruim para o setor, ela também pode, paradoxalmente, gerar algo melhor para todos. Esperemos que seja esse o caso.

Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “Supremacy: AI, ChatGPT and the Race That Will Change the World.”

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