Dólar fraco impulsiona moedas latino-americanas no 1º semestre; real lidera ganhos

Divisa americana acumulou desvalorização global em 2025, mas contexto da região também se beneficiou do aumento do apetite global por ativos de mercados emergentes

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Bloomberg Línea — Dívidas menores em dólar, viagens mais acessíveis aos Estados Unidos e compras internacionais mais baratas. Foi isso que muitos latino-americanos desfrutaram no primeiro semestre do ano, graças à queda do dólar em 2025, que permitiu que praticamente todas as moedas da região se valorizassem em relação ao dólar americano.

Além dos fatores locais, que existiram, a região não ficou imune ao comportamento global da moeda americana, com uma deterioração estrutural que a levou a níveis não vistos em três anos.

Dúvidas em torno do chamado excepcionalismo americano, pressão sobre o Federal Reserve, preocupações fiscais e a volatilidade gerada pelo governo Donald Trump diminuíram o valor da moeda.

“O principal fator que explica essa valorização que temos observado neste primeiro semestre está associado à desvalorização generalizada do dólar americano”, explicou Felipe Juncal, economista para o México e América Latina do Citigroup.

“Embora tenhamos observado episódios de volatilidade, principalmente associados ao conflito no Oriente Médio, a narrativa de um dólar fraco volta a ganhar força”, acrescentou.

Em meio a essa desvalorização generalizada do dólar, as moedas das duas maiores economias da região, Brasil e México, foram as mais valorizadas durante o primeiro semestre do ano.

Valéria Álvarez, chefe de estratégia do Itaú Colômbia, observou que o real brasileiro se valorizou 13,73% até o momento em 2025. Essa alta é parcialmente explicada pela desvalorização generalizada do dólar e pelo aumento do apetite global por ativos de mercados emergentes.

Além disso, ela destacou que esse desempenho está intimamente ligado ao atrativo carry trade oferecido pelo Brasil, graças às suas taxas de juros de quase 15%, que estão entre as mais altas do mundo.

No caso do México, Gabriela Siller, diretora de Análise Econômica do Banco Base, afirmou que o carry trade, o diferencial atrativo de taxas de juros entre o Banco do México e o Federal Reserve (Fed), também desempenha um papel, incentivando a entrada de capital em carteira.

“O peso mexicano se beneficiou do apetite global por ativos de mercados emergentes, em um ambiente em que os investidores internacionais continuam buscando rendimento”, acrescentou Siller.

A moeda mexicana valorizou-se 11,09% no primeiro semestre do ano, embora os riscos não estejam ausentes para o restante do ano. A Juncal espera que a narrativa de dólar fraco continue, razão pela qual eles veem a taxa de câmbio acima de MXN$ 18,98.

No entanto, existem fatores que podem pressionar a taxa de câmbio para cima, como movimentos nas taxas de juros ou maior incerteza.

Siller prevê que a taxa de câmbio continuará apresentando volatilidade no restante do ano, com tendência à depreciação, impulsionada principalmente pelo ciclo de ajustes nas taxas de juros.

As moedas da Colômbia, Chile e Peru não ficaram imunes aos ganhos em relação ao dólar.

Apesar das dúvidas fiscais, o peso colombiano valorizou-se 7,47%, também apoiado pela atratividade do carry trade. “O Banco da República tem sido muito cauteloso e a Colômbia também continua oferecendo um carry melhor”, disse Álvarez, diretor de estratégia do Itaú Colômbia.

Para o analista, o ruído fiscal parece estar de certa forma incorporado aos ativos, embora eventos que possam impactar a moeda ocorram no segundo semestre do ano.

Por exemplo, a próxima semana marca o prazo estabelecido pelo governo Trump para impor novas tarifas, e uma semana depois é o prazo para o Congresso aprovar a reforma tributária.

No caso do peso chileno, que se valorizou 6,79% no primeiro semestre do ano, e do sol peruano, que se valorizou 5,58%, eles se beneficiaram do desempenho do cobre.

Além disso, no caso do Chile, um ambiente externo mais favorável para as economias emergentes e uma certa estabilidade no risco-país foram fatores-chave, explicou Gonzalo Muñoz, analista de mercado da XTB Latam.

No entanto, ele alertou que essa tendência pode se reverter no segundo semestre do ano. “O dólar continua em alta e, em contextos de incerteza, volta a se posicionar como um porto seguro”, indicou Muñoz.

A inflação persistente nos EUA, as tensões geopolíticas com a China e o risco de novas tarifas são fatores que podem fortalecer o dólar novamente. Para Muñoz, isso o mantém como “uma ferramenta-chave de hedge dentro de um portfólio diversificado”.

A valorização do sol peruano em relação ao dólar é explicada principalmente por sólidos fundamentos internos, destacou David Enrique Lizama Olaya, analista sênior de renda fixa da Renta 4 Perú.

Ele acrescentou que os altos lucros da mineração reportados em março de 2025 e o bônus de meio de ano para trabalhadores dependentes pressionaram a taxa de câmbio, juntamente com a queda global do DXY devido à turbulência geopolítica internacional.

No entanto, Lizama alertou que “o único fator que poderia reverter essa tendência é a turbulência política eleitoral”, observando que um cenário de alta incerteza impactou a taxa de câmbio em mais de 400 pontos-base. A Renta 4 projeta uma taxa próxima a PEN$ 3,50 como valor justo, sem considerar o risco político.

O peso argentino encerrou o semestre como a principal moeda da região a se desvalorizar em relação ao dólar, em meio à implementação do novo programa do país com o FMI.

O banco central permite que a taxa de câmbio flutue dentro de uma banda inicial de 1.000 a 1.400 pesos argentinos por dólar, sem comprar moeda estrangeira dentro da banda, mantendo uma política monetária restritiva para priorizar a desinflação.