Bloomberg Opinion — As palavras mais perigosas no mercado de petróleo são: “a Opep está morta”. O obituário do cartel do petróleo já foi escrito muitas e muitas vezes – e sempre de forma prematura.
A saída quase ininterrupta de países membros durante a última década – Indonésia em 2016, Catar em 2019, Equador em 2020 – proporcionou uma ampla oportunidade para preparar discursos de adeus, todos eles um desperdício de palavras.
Enquanto a Indonésia, o Catar e o Equador saíram do grupo, o Gabão entrou novamente na Opep em 2016, seguido pela Guiné Equatorial em 2017 e pela República do Congo em 2018. Com a saída de Angola, a Opep ficará com 12 membros.
Então, será que a saída de Angola, anunciada nesta quinta-feira (21), é apenas mais um tropeço para a Opep? À primeira vista, é irrelevante. Mas tem implicações mais profundas para o bloco que vão além do que significa para o fornecimento global de petróleo cru.
Dentro da Opep, o poder é medido em milhões de barris por dia. Angola não bombeia muitos, e há pouca chance de produzir mais em um futuro próximo. De acordo com a Agência Internacional de Energia, Angola bombeou quase 1,1 milhão de barris por dia em novembro, uma queda de 45% em relação ao pico de mais de 1,9 milhão de barris em 2010.
Além disso, o país já está em sua capacidade total. Compare isso com a Arábia Saudita, que produz cerca de 9 milhões de barris, menos do que seu potencial de 12,5 milhões.

A saída de um país da Opep preocuparia os remanescentes – e qualquer um que esteja otimista em relação aos preços do petróleo – se esse país pudesse aumentar rapidamente a produção utilizando sua capacidade ociosa ou desenvolver novos campos de petróleo ao longo do tempo.
Mas Angola não pode fazer nenhuma dessas coisas. Não há mais produção disponível e não há investidores estrangeiros batendo à sua porta para financiar a exploração e o desenvolvimento.
Seja dentro ou fora da Opep, o auge do setor petrolífero angolano já passou. Dessa forma, sua saída reflete o impacto limitado das saídas anteriores. A Indonésia, o Catar e o Equador não alteraram o equilíbrio entre a oferta e a demanda global desde que deixaram a organização.
Mas a saída sinaliza alguns acontecimentos preocupantes para o clube do petróleo. O anúncio, no qual o governo em Luanda expressou abertamente sua frustração com o cartel, lança alguma luz sobre um segredo aberto: muitos países membros da Opep não estão nada satisfeitos com a direção que o grupo tomou nos últimos anos sob a liderança da Arábia Saudita.
A opinião, expressa sempre de forma reservada, é que Riad tenta manter os preços do petróleo muito altos, próximos a US$ 100 por barril, o que ajuda os rivais, principalmente o setor de xisto dos EUA.
Se a Opep continuar fazendo isso, mais cedo ou mais tarde terá que cortar ainda mais a produção, cedendo mais participação no mercado. Outros membros da Opep ficariam satisfeitos com preços do petróleo mais baixos, na faixa de US$ 60 a US$ 70.
Essa reclamação vem acompanhada de outra: Riad, sob o comando de seu ministro da Energia, o Príncipe Abdulaziz bin Salman, não ouve as preocupações dos outros e tenta intimidar quaisquer opiniões dissidentes para que se submetam.
O principal país a ser observado não é Angola, mas os Emirados Árabes Unidos, que recentemente venceram uma campanha árdua contra Riad para garantir um nível mais alto de produção da Opep.
Não acredito que Abu Dhabi tenha terminado. Durante a campanha, os diplomatas dos Emirados chegaram ao ponto de questionar o valor da participação na Opep.
Acredito que esses briefings foram mais uma ferramenta na campanha para garantir um aumento da cota do que uma ameaça real. Mas isso mostra que nem tudo são rosas dentro do cartel.
Os Emirados Árabes Unidos não só têm ampla capacidade ociosa – bombeiam 3,1 milhões e provavelmente podem produzir 4 milhões – como também contam com apoio estrangeiro para investir em novos campos de petróleo que aumentariam a capacidade de produção para até 5 milhões de barris.
A saída de Angola torna mais provável que Riad tenha que permitir que os Emirados Árabes Unidos produzam, com o tempo, ainda mais petróleo. Os riscos para a Opep começam em Luanda – mas, em última instância, terminam de forma mais perigosa em Abu Dhabi.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Jabier Blas é colunista da Bloomberg Opinion que cobre energia e commodities. É coautor de “The World for Sale: Money, Power, and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.
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