Em março, o SVB entrou em colapso após seus depositantes correrem ao banco para sacar suas aplicações (Foto: David Paul Morris/Bloomberg)
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Bloomberg Opinion — O colapso do Silicon Valley Bank (SVB) em março e de alguns outros bancos americanos logo em seguida obrigou as autoridades a rever uma questão difícil: o que o governo deve fazer para evitar futuros pânicos bancários? Deveria expandir novamente a cobertura para depósitos?

Talvez haja uma forma melhor.

O desastre do SVB ilustrou três pontos fracos fundamentais dos bancos modernos.

Primeiro, em uma era de transações online e redes sociais, as corridas bancárias podem ocorrer com uma velocidade sem precedentes. Segundo, os depositantes não segurados não são uma fonte confiável de disciplina de mercado – eles funcionam em apenas dois modos: desatenção total ou pânico total. Terceiro, as autoridades não dispõem de ferramentas adequadas para evitar o pânico.

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A “exceção de risco sistêmico” usada para resgatar os depositantes não segurados do SVB pode ser invocada somente após a quebra de um banco e caso a caso, de modo a oferecer conforto limitado aos depositantes de outras instituições.

Para resolver essas deficiências, alguns políticos e autoridades querem aumentar o limite do seguro de depósito federal dos atuais US$ 250 mil por conta – ou até mesmo acabar com essa condição. Mas isso criaria seus próprios problemas.

Por um lado, abrangeria todas as instituições, independentemente de como fossem administradas, e, portanto, incentivaria os bancos a assumir riscos ainda maiores, como demonstrou a crise de poupança e empréstimo da década de 1980. Em segundo lugar, exigiria um grande aumento nas contribuições dos bancos para o fundo de seguro de depósitos (do FDIC), forçando efetivamente as instituições administradas de forma conservadora a subsidiar suas contrapartes mais agressivas.

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O que é necessário é um instrumento que crie os incentivos adequados para que os bancos gerenciem os riscos. Com isso em mente, eu proporia uma expansão da função de banco de último recurso do Federal Reserve (em linha com um mecanismo proposto por Mervyn King, que comandou o Banco da Inglaterra durante a crise financeira de 2008). Em vez de oferecer uma garantia geral, o Fed prometeria emprestar aos bancos o dinheiro necessário para pagar todos os seus depositantes não segurados – mas, em troca, os bancos teriam que dar garantias suficientes para cobrir esses depósitos.

As garantias de maior qualidade receberiam mais crédito: o banco central poderia concordar em emprestar US$ 99 contra US$ 100 em títulos do Tesouro de curto prazo, mas apenas US$ 50 contra US$ 100 em empréstimos corporativos arriscados de longo prazo. Com essa garantia em vigor, os depositantes não segurados não se sentiriam compelidos a correr aos bancos, pois saberiam que seu banco sempre conseguiria obter dinheiro suficiente para honrar seus pedidos de saque.

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Bancos bem capitalizados com amplos ativos de alta qualidade não teriam problemas para atender às exigências de garantia do Fed.

Por outro lado, os bancos mais arriscados, com muitos depositantes não segurados, teriam mais dificuldades e enfrentariam incentivos poderosos para mudar sua forma de operar. O Silicon Valley Bank, por exemplo, teria ficado sem garantias para cobrir seus depósitos não segurados muito antes do início do pânico.

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Para recuperar seu status de conformidade, o banco teria que levantar capital, aumentar sua participação nos depósitos segurados ou reduzir o risco de seus ativos – etapas que poderiam ter evitado o pânico e a crise desde o início.

Esse mecanismo poderia expor o Fed a prejuízos mediante o colapso de um banco. Mas o banco central poderia minimizar esse risco ao ser cauteloso na decisão de quanto emprestar com vários tipos de garantias­ – ou seja, estabelecendo margens conservadoras.

Em termos mais amplos, é provável que o Fed também queira estabelecer uma margem de erro – por exemplo, exigindo que o total de garantias prometidas exceda os ativos executáveis em 10%, aos quais os bancos provavelmente acrescentariam outros 5% para garantir que não ficassem abaixo do limite.

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O histórico do Fed nesse aspecto é tranquilizador. Suas margens de segurança para os empréstimos tradicionais da janela de desconto e para os empréstimos de emergência sempre foram conservadoras.

O Fed obteve lucro em todas as suas intervenções extraordinárias na crise financeira de 2008, incluindo empréstimos feitos contra garantias arriscadas e ilíquidas do banco de investimento Bear Stearns e da seguradora AIG.

Quando as coisas dão errado, as autoridades devem avaliar se os incentivos estão bem alinhados com os resultados que buscam. Caso contrário, os incentivos precisam ser alterados. Apoiar os depósitos de forma a incentivar os bancos a agirem com responsabilidade seria um excelente ponto de partida.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Bill Dudley, colunista da Bloomberg Opinion e consultor sênior da Bloomberg Economics, é pesquisador sênior do Center for Economic Policy Studies, da Princeton University. Ele atuou como presidente do Federal Reserve Bank de Nova York de 2009 a 2018 e como vice-presidente do Federal Open Market Committee. Anteriormente, foi economista-chefe dos EUA no Goldman Sachs e atualmente é diretor não executivo do banco suíço UBS desde 2019

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