Mercado de escritórios na Paulista recupera valor com onda de reformas

Um terço dos imóveis comerciais da região passa por retrofit que resulta em aumento do metro quadrado para aluguel, aponta levantamento da JLL

Vista da avenida Paulista fechada para carros aos domingos: onda de investimento em renovação de escritórios (Patricia Monteiro/Bloomberg)
14 de Abril, 2023 | 04:45 AM

Bloomberg Línea — Símbolo de São Paulo, a avenida Paulista já foi a mais procurada da capital para empreendimentos corporativos, mas, ao longo de décadas, perdeu o protagonismo para outras regiões, notadamente a Faria Lima. Um movimento recente de investidores, no entanto, tem recuperado parte da relevância da avenida e de ruas no seu entorno como sede de escritórios, em uma onda de revitalização - o retrofit - de edifícios que eleva o valor dos imóveis e, em alguns casos, dobra o preço do metro quadrado.

Segundo levantamento da consultoria global Jones Lang LaSalle (JLL), a pedido da Bloomberg Línea, 15,6% do estoque total da região da Paulista – aproximadamente 170 mil m² – passou por retrofit. Dos imóveis de alto padrão (AA e A, na nomenclatura da consultoria), 35% passaram pelo processo.

O setor financeiro é o mais relevante no espaço ocupado. As dez maiores empresas – metade do setor financeiro – representam 30% da área total ocupada na região.

Segundo a diretora de locações de escritórios da JLL, Yara Matsuyama, há um acréscimo no valor do metro quadrado em prédios que passaram por retrofit na região da avenida Paulista.

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O caso de maior aumento, segundo o levantamento da JLL, foi verificado no edifício Bravo Paulista, que fica na alameda Santos próximo ao parque Trianon. O prédio foi comprado em 2020 por um fundo imobiliário (RCRB11) da gestora Rio Bravo Investimentos. O preço do metro quadrado subiu de R$ 55 para R$ 130 logo após a conclusão do retrofit. Hoje, esse valor está em cerca de R$ 100, segundo a consultoria.

“O retrofit na região da Avenida Paulista tem como objetivo levar novas tecnologias a edifícios mais antigos, dentro do que é possível ser feito. Trata-se de um eixo importante, com fácil acesso para a cidade inteira. Vemos muitas empresas interessadas nessa malha”, disse Matsuyama.

Conforme o levantamento, também houve um aumento de valor do metro quadrado no edifício Martiniano de Carvalho, de propriedade de um fundo imobiliário do Credit Suisse (CSHG): o preço passou de R$ 70 para R$ 90 depois da reforma. Atualmente, o metro quadrado está em R$ 95.

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Também na alameda Santos, paralela à Avenida Paulista para o lado dos Jardins, o metro quadrado do edifício 2477 teve um aumento de preço de R$ 75 para R$ 100 o metro quadrado depois do retrofit. O prédio é de propriedade da São Carlos Empreendimentos (SCAR3), empresa controlada pelas famílias dos bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.

A JLL apontou ainda que o Brazilian Financial Center, do fundo imobiliário BRCR11, do BTG Pactual (BPAC11), obteve um upgrade em sua classificação após o processo de retrofit. O prédio que foi conhecido no passado por abrigar a sede do extinto Banco Real (adquirido pelo Santander) hoje abriga inquilinos como a emissora CNN Brasil e a WeWork, além do Banco Pan (BPAN4), entre outros.

“Há casos em que é possível deixar o prédio mais atualizado com o retrofit, o que acaba sendo um diferencial, como o Brazilian Financial, que tem uma procura grande”, afirmou João Toazza, sócio e gestor da Hedge Investments, uma das maiores gestoras de fundos imobiliários do país.

Na avaliação do CEO da HSI, gestora de fundos imobiliários e atuação em real estate, Maximo Lima, a avenida Paulista, apesar de imóveis em geral mais antigos, apresenta uma vantagem competitiva em relação a outras regiões com grande concentração de escritórios: a infraestrutura urbana. “A Faria Lima não tem nada, só uma ciclovia e muito trânsito. E é a mais valorizada de São Paulo.”

Segundo o gestor, o ponto forte da Paulista é a oferta abundante de metrô - há cinco estações e três linhas diferentes em sua extensão, de linhas de ônibus e a localização relativamente central. A depender da atividade exercida pelo inquilino, apontou, é uma região bastante adequada.

“Investidores ainda gostam da Paulista por causa disso e porque apresenta certa estabilidade: o aluguel não dispara mas também não despenca em momentos de crise”, afirmou. Segundo o CEO da HSI, a região funciona com eficiência para o investidor que busca renda sem grandes “sustos”.

Desafios: conta tem que fechar

A onda de revitalização de edifícios comerciais na região da Paulista em muitos casos vai além da fachada. O sócio e gestor da Alianza, gestora de fundos imobiliários, Fábio Carvalho, disse que há muitos prédios antigos, com estruturas elétrica, hidráulica e de ar-condicionado desatualizadas, além de pé-direito mais baixo do que em construções mais recentes e, portanto, consideradas modernas.

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“Os empreendimentos da Paulista têm dificuldade de competir com os da Faria Lima e os do Itaim como um todo”, afirmou o gestor.

Segundo ele, outro obstáculo é a elevação nos últimos anos dos custos de construção, o que exige de investidores quantias ainda maiores para a renovação ou o desenvolvimento de novos empreendimentos, sem contar o aumento do custo de capital. “Levaria muito tempo para ter o retorno”, disse.

Matsuyama afirmou que os prédios corporativos da região da Paulista foram concebidos em uma época de grande relevância atribuída ao patrimônio, o que levou a uma grande pulverização das propriedades dos edifícios. Isso significa que “é difícil conseguir maioria para aprovar um retrofit”.

Segundo a executiva, boa parte dos empreendimentos da região da Paulista tem um padrão antigo de construção, com itens considerados ineficientes, como elevadores defasados. “O grande desafio é trabalhar na modernização de um prédio de meados da década de 1970 e garantir um custo de retrofit viável para manter ou elevar o valor de locação. A conta tem que fechar.”

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Há casos em que isso acontece com a propriedade do prédio de forma integral. Toazza, da Hedge, disse que um prédio residencial na Alameda Santos de propriedade do fundo Hedge Office Income FII foi 100% transformado em comercial depois que um empreendedor se dispôs a comprar unidade após unidade até obter a totalidade do edifício.

“Logo que esse projeto foi finalizado, foi 100% locado para um escritório de advocacia de primeira linha, que renovou o contrato por mais sete anos em 2022, porque não havia outra alternativa de prédio com aquela qualidade e a metragem disponível na região da Paulista”, contou o executivo.

Faria Lima: vacância reduzida leva à ‘migração’

Segundo a JLL, a vacância na região da Paulista está em torno de 14,5%, em média. “É um nível equilibrado, com opções disponíveis. Se há pouca oferta, já começa um movimento de aumento de preço”, disse Matsuyama.

É o que tem acontecido na Faria Lima já há mais tempo. O nível de vacância, segundo a JLL, está em 4,5% na região, com o metro quadrado em torno de R$ 250. É resultado de uma combinação de uma região altamente demandada com pouco oferta nova - os melhores escritórios estão ocupados.

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Nesse cenário, o CEO da HSI disse acreditar em um movimento de migração da Faria Lima para regiões próximas, como as proximidades da avenida Rebouças e do Largo da Batata, já no bairro de Pinheiros, por exemplo. “Essas regiões vão acabar se beneficiando”, disse Lima.

O gestor disse que o histórico da Faria Lima e da Chucri Zaidan, eixo de escritórios na zona sul da capital paulista, é um diferencial em relação à avenida Paulista, já que essas duas regiões se desenvolveram com prédios corporativos de proprietários profissionais, basicamente fundos de investimentos - e isso significa que programam capex periódico para a renovação dos empreendimentos.

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“A tendência desses edifícios é envelhecer melhor. Alguns na Paulista não precisam somente de uma plástica, mas de um recomeço. Só retrofit não vai ajudar a elevar o valor do metro quadrado.”

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.