Famílias Lemann, Telles e Sicupira vendem prédio do Mappin em SP para o Sesc

São Carlos Empreendimentos decide vender o imóvel que estava ocupado até pouco tempo atrás pela Casas Bahia; valores não foram divulgados

Edifício João Brícola, conhecido como Prédio do Mappin, fica na Praça Ramos, no centro histórico de São Paulo
31 de Março, 2023 | 06:57 PM
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Bloomberg Línea — A São Carlos Empreendimentos (SCAR3), empresa de investimentos em imóveis comerciais, controlada por parentes dos acionistas principais da Americanas (AMER3), fechou a venda do Prédio do Mappin, como é conhecido o Edifício João Brícola, um marco histórico do centro de São Paulo. O comprador é a administração paulista do Sesc (Serviço Social do Comércio), confirmou a entidade privada mantida por empresários dos setores de comércio, serviços e turismo, à Bloomberg Línea.

O valor do negócio não foi divulgado. O imóvel de 13 pavimentos, datado de 1939, com 12.106 m², foi adquirido em 2019 por R$ 70 milhões. A São Carlos não quis comentar o tema. O SescSP informou que o local abrigará uma nova unidade.

“A aquisição ainda é uma operação recente, e a ocupação está em fase de planejamento. O nome considerado é Sesc Praça Ramos”, acrescentou a assessoria de imprensa da entidade, em e-mail.

Até o início do mês, o Prédio do Mappin era ocupado pela Casas Bahia, rede de eletrodomésticos da Via (VIIA3), que pagava aluguel de R$ 700 mil, segundo uma fonte da São Carlos ouvida pela reportagem. Em 2022, a companhia reportou prejuízo de R$ 72,6 milhões, após um lucro de R$ 22,5 milhões no ano anterior.

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A empresa é controlada por membros das famílias do trio de sócios bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, da 3G Capital, principais acionistas da Americanas, que entrou em recuperação judicial em janeiro. Jorge Felipe Lemann e Marc Lemann são integrantes do conselho de administração, que conta ainda com Eduardo Saggioro, sócio da LTS Investments, empresa de investimentos do trio.

O edifício que abrigou a sede do falido Mappin, pioneiro do modelo de magazine no Brasil, antecessor dos shopping centers, está ao lado do Shopping Light, que passou a ganhar um fluxo maior de turistas e gourmets após a Mastercard lançar um complexo gastronômico no seu rooftop em 2021.

A São Carlos é considerada uma das maiores proprietárias de edifícios de escritórios do país, mas não vive seu melhor momento, a exemplo de outras empresas do setor, diante do aumento do custo do capital com os juros básicos da economia em 13,75% ao ano e sinais de um quadro recessivo.

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A companhia foi criada por parentes de Lemann, Telles e Sicupira para atuar na compra e venda de imóveis, locação e administração de empreendimentos imobiliários próprios ou de terceiros - entre eles, alguns imóveis ocupados pela Americanas.

O Edifício Brícola pertencia, inicialmente, à Santa Casa de Misericórdia. O contador João Brícola foi tesoureiro da entidade hospital filantrópica e deixou o imóvel para a Santa Casa após morrer em 1914.

Segundo dados da B3, o capital da São Carlos está nas mãos de parentes do trio da 3G Capital e de algumas gestoras. O site da empresa aponta que os acionistas controladores possuem, somados, 53,42% do capital.

A Bolsa identifica as seguintes posições acionárias: Paulo Alberto Lemann (3,32%), Anna Victoria Lemann Osório (3,40%), Susanne Mally Lemann (2,49%), Marc Lemann (2,50%), Lara Lemann (2,49%), Kim Lemann (2,49%), Cecília Sicupira (5,62%), Helen Sicupira Rodas (5,56%), Heloisa de Paula Machado Sicupira (5,57%), Christian Van Hoegaerden Herrmann Telles (8,34%), Max Van Hoegaerden Herrmann Telles (8,34%) e Cecília de Paula Machado Sicupira (0,01%).

Também aparecem como acionistas a Alaska Investimentos (5,61%), Aco Fim Crédito Privado Investimento no Exterior (16,88%), fundo gerido pela gestora M8 Partners, Sawdog Holding LLC (0,41%), Denson Finance LLC (0,41%) e Cedar Trade LLC (0,50%).

O portfólio da empresa de investimentos em imóveis comerciais é avaliado em R$ 5,5 bilhões e inclui edifícios de escritórios comerciais de alto padrão, centros de conveniência e empreendimentos residenciais, situados em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ela controla a Best Center, dona de 50 centros de conveniência.

A estratégia de negócios da companhia contempla a aquisição de imóveis, a implementação de melhorias, como investimento em retrofit (reformas) e otimização da administração condominial, e posterior venda dos imóveis para reinvestimento em novos projetos, buscando rentabilidades elevadas.

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Herdeiros do café

Hoje a região do centro velho de São Paulo é considerada uma espécie de mina de ouro a ser desenvolvida para o mercado imobiliário, pois o poder público e entidades como o Sesc tocam projetos de revitalização urbana. São prédios, em boa parte, pertencentes a famílias ricas do ciclo econômico do café, uma das principais bases da riqueza e do desenvolvimento do estado no século passado. Não são raros os casos em que esses imóveis sejam alvos de disputas judiciais pelos herdeiros.

Em 2017, o Sesc inaugurou ali perto o Sesc 24 de Maio, com projeto do arquiteto Paulo Mendes da Rocha e investimento estimado em R$ 120 milhões, segundo valores divulgados à época.

A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (Smule) de São Paulo identificou que 881 imóveis estejam na condição de construção ociosa (desocupada, inativa ou subutilizada, sem cumprir função social) apenas no distrito da Sé, que tem o Vale do Anhangabaú como um dos seus limites.

Um estudo apresentado na FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), da USP (Universidade de São Paulo), apontou que 74% dos imóveis analisados são de herdeiros e instituições religiosas, denominados na pesquisa como “o arcaico setor proprietário rentista imobiliário”.

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Para chegar a esses dados, a pesquisadora Ana Gabriela Akaishi, verificou os perfis dos 50 donos dos imóveis de maior valor venal da área -número que estima o preço do bem, obtido por meio de uma avaliação pela prefeitura, informou um texto publicado pelo “Jornal da USP” no último dia 7 de março.

“Esses proprietários carregam raízes históricas e geracionais vinculadas a capitais familiares antigos de caráter mercantil, que aplicavam inicialmente em prédios de aluguel no momento em que o centro de São Paulo estava em um boom no processo de verticalização”, disse a pesquisadora.

Historicamente, a área central de São Paulo era considerada um centro comercial e cultural desde a fundação da cidade. “Grandes empresas e corporações mantinham suas sedes na região, com grandes arranha-céus e prédios que chamavam atenção de quem passava por lá.”

“Lojas e casarões de barões do café também se destacavam junto a obras arquitetônicas grandiosas, como o Theatro Municipal. Contudo, com a mudança do centro comercial para outros bairros da cidade na década de 1960, a área passou por um grave e acelerado processo de decadência e deterioração, com aumento da especulação imobiliária”, citou a publicação.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.