Em tempo de crise, este unicórnio brasileiro quer buscar o breakeven sem aporte

Startup de social commerce Facily fez demissões e fechou centros de distribuição em 2022; CEO diz que novo modelo de negócios pretende dispensar capital externo

Facily, startup de social commerce, levantou mais de meio bilhão de dólares com investidores até 2021
25 de Março, 2023 | 03:25 PM

Bloomberg Línea — O segundo ano do ambiente com juros elevados, capital escasso e desaceleração da economia exige das startups modelos de negócios adaptados à nova realidade.

Para a Facily, startup de social commerce financiada pelo grupo de investimentos Prosus e pelo fundo americano Goodwater e que atingiu no fim de 2021 o estágio de unicórnio, 2022 foi um ano de cortar custos, fazer rodadas de demissões e fechar de centros de distribuição no Brasil. O CEO Diego Dzodan, ex-presidente do Facebook e da SAP na América Latina, afirmou que a empresa tem um plano para atingir o breakeven (o ponto de equilíbrio entre receita e despesa) até o final do ano.

“Quando vimos que o mercado tinha mudado e que realmente a liquidez global iria mudar, nós também mudamos nossa estratégia. Nesse contexto seria muito difícil levantar dinheiro e tínhamos caixa suficiente para executar o projeto que tínhamos sonhado para a Facily. Desde dezembro de 2021 nunca mais falamos com um fundo para captar”, disse Dzodan em entrevista à Bloomberg Línea.

“Estamos executando um modelo em que a Facily não precisará mais de financiamento externo. Hoje, com o caixa que temos, se continuássemos gastando, duraria anos. Não temos problemas de caixa no curto prazo”, afirmou o executivo.

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Inspirada no Pinduoduo (hoje PDD), uma empresa de tecnologia chinesa de comércio eletrônico, a Facily foi fundada em 2018 por Dzodan, Vitor Zaninotto (ex-SAP) e Luciano Freitas (ex-Airbnb e ex-Uber), que deixou a Facily no mês passado para assumir o cargo de VP de marketing no Hotmart.

Costumeiramente com fluxo de caixa negativo, a startup teve quatro rodadas de financiamento desde 2021, finalizando o ano passado com US$ 503 milhões em investimentos de fundos estrangeiros.

Além da Prosus e da Goodwater, a Facily também recebeu dinheiro da Rise Capital, fundo do Vale do Silício que investe em startups de early stage em mercados emergentes, da Tru Arrow, empresa de James Rothschild, e da Emerging Variant, fundo hedge para a América Latina fundado em 2017 por Santiago Jariton, ex-gestor do family office de George Soros que supervisionava investimentos na América Latina.

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A Facily foi avaliada em pouco mais de US$ 1,1 bilhão em dezembro de 2021. E Dzodan disse que o valuation não mudou.

O conselho da Facily determinou um plano para alcançar o breakeven e também para o ponto em que não será necessário mais tirar dinheiro do caixa da empresa porque a geração de receita na operação será suficiente para pagar as contas.

Quando os juros estavam em patamares baixos no mundo, as empresas de tecnologia não precisavam ter tanta pressa para chegar ao breakeven. Mas agora - há um ano pelo menos, na verdade -, com o custo de capital mais caro, investidores de startups estão demandando que esse equilíbrio seja alcançado o mais brevemente possível. Ou que pelo menos exista um plano claro para fazer isso.

Outras - ou quase todas - empresas do setor também estão em uma situação parecida. A Loft, unicórnio para compra e venda de imóveis, que cortou mais 340 funcionários na semana passada e que há um ano reduz custos com pessoal, disse que pretende atingir o breakeven até dezembro de 2023.

Dzodan disse que que a Facily retomou o crescimento em janeiro, com 30% de crescimento em receita e com clientes voltando para a plataforma.

“Em todo o ano passado nos dedicamos a melhorar muito a experiência do cliente, principalmente no prazo de entrega. Estamos entregando por volta de três dias e não cobramos frete do cliente. Conseguimos absorver o custo de frete dentro da nossa margem e entregamos um preço que é levemente inferior ao preço ao do atacado”, afirmou.

Modelo de negócio

A Facily promove compras em grupo. Mas, diferentemente de outras empresas de delivery, não entrega os produtos na casa do consumidor, mas em pontos de retirada por meio de parceiros. A startup, que antes tinha operações espalhadas pelo território brasileiro, com centros de distribuição em Fortaleza, Recife e Salvador, encolheu para ter foco no estado de São Paulo.

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Hoje a empresa tem um centro de distribuição, com uma base de 15 milhões de clientes, segundo seus dados.

Recentemente a startup fez uma parceria com o braço logístico do Alibaba, a Cainiao, para a implementação de mil “armários inteligentes” em seus pontos de coleta.

A Facily tem como base um negócio de logística por densidade, o que permite em tese que um mesmo caminhão transporte muitos pacotes com um custo baixo. Assim, a empresa consegue uma margem que sustentaria o negócio. A startup diz que consegue oferecer preços mais baratos porque conecta produtores com clientes finais e elimina intermediários.

“Em negócios de tecnologia com consumo massivo mais difícil, há muita volatilidade do lado do fluxo de caixa e dos ativos em como tentar colocar um fluxo de pagamento de uma dívida que é muito fixa”, afirmou.

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Reestruturação

Dzodan disse que o ano de 2022 da Facily foi complicado porque a empresa teve que acelerar a execução para entregar em um ano o que antes seria feito em dois. O principal gargalo foi aperfeiçoar processos em tecnologia para ter uma logística rápida e com baixo custo.

“Software não serve só para captar o pedido, mas prepará-lo mais rapidamente, imprimir uma etiqueta e seguir uma sequência de passos. Temos que entregar esse pedido em algum dos pontos de coleta ou no centro de distribuição central”, disse.

“Temos que escrever o software para receber esse produto, ter todo o rastreio desse produto para saber o que acontece com esse pedido, direcionar ele para o caminhão que vai levar para o ponto de entrega e que esse caminhão saia com um volume de carga que permita recuperar o custo do caminhão. São muitos algoritmos e processos que têm que ser automatizados para que funcione”, afirmou.

Diego Dzodan contou que a empresa voltou a contratar. O objetivo é crescer o negócio, em média, 30%. “São expansões auto-financiadas [..] Alinhamos com nosso conselho o plano. Agora estamos recuperando o sonho e executando com tudo que é viável”, afirmou.

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O CEO da Facily disse que ganhar escala sem o mesmo nível de recursos de capital requer um planejamento mais exaustivo do que era feito em 2020 e 2021.

“Antes colocávamos os recursos atrás dos problemas e resolvíamos, agora tem que ser via eficiência e via planejamento. Dá muito mais trabalho aumentar a capacidade de logística sem aumentar custos. Se a densidade cai, aumenta o custo, o que deixa de ser viável o ponto de equilíbrio”, disse o CEO.

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“Temos que aumentar a escala mantendo o nível de eficiência, esse é o desafio. E sempre cuidando da experiência do cliente, já tivemos muitos aprendizados nisso. nosso cliente é o juiz que diz se estamos fazendo um bom trabalho”, disse.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups