Tudo fica mais caro em Nova York, mas um produto está na contramão: a maconha

Legalização do uso recreativo no estado e excesso de produção na Califórnia ajudam a explicar queda de 60% no preço em dois anos, o que ampliou a oferta na cidade

Cannabis
Por Paulina Cachero
17 de Dezembro, 2022 | 06:04 PM

Bloomberg — Nunca foi tão fácil conseguir maconha em Nova York.

Vendedores negociam brotos, vaporizadores e comestíveis abertamente nas mesas da Union Square. Pequenas vendas anunciam maconha em suas vitrines. Até mesmo os mercados temporários montados para o Natal têm vendedores de ervas ao lado de joias e enfeites para as festas de fim de ano.

A maconha foi legalizada em Nova York há quase dois anos, mas as lojas licenciadas ainda não abriram. Nesse período, a maconha inundou a cidade e é vendida abertamente nos cinco grandes bairros. E as leis de oferta e demanda estão funcionando: os preços da maconha estão caindo em um momento em que tudo, desde mantimentos e aluguel até contas de luz e bares na cidade, ficou mais caro.

Joe Camerota se lembra dos dias em que um entregador cobrava US$ 50 por menos de um oitavo de onça, medida americana - nesse caso, equivalente a menos de quatro gramas. Hoje, vendedores abordam o comediante de 39 anos quando ele fuma maconha na varanda de sua casa no Brooklyn e fazem ofertas que ele pensou que nunca veria: US$ 80 por uma onça, equivalente a 28,35 gramas.

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Na região de Nova York, Newark e Nova Jersey, a inflação ao consumidor sobe na casa de 7% ao ano. Preços de alimentos ficam mais caros na ordem de quase 9% ao ano, e os de energia, de 20%.

“De repente, alguns caras vêm até mim perguntando quanto estou pagando por uma onça e dizendo que eles podem vencê-lo”, disse Camerota. “Neste ano, o preço de tudo subiu – exceto para maconha e Arizona Iced Tea [uma marca de bebida].”

A maconha está disponível há muito tempo na cidade de Nova York, com serviços de entrega e traficantes de rua para compradores dispostos a se envolver na então economia ilícita.

Mas Nova York é agora um dos 21 estados que legalizaram o uso recreativo de cannabis, ainda que não se espere que os licenciados no estado abram até 2023. Essa lacuna permitiu que os revendedores do chamado mercado cinza proliferassem enquanto as lojas legais esperam nos bastidores.

Enquanto isso, um excesso de produção maconha cultivada na Califórnia, que alguns vendedores ilícitos chamam de “Reserva Federal” para a cannabis - uma alusão ao Federal Reserve, o banco central - reduziu os preços no atacado em 60% em relação ao pico no outono de 2020, incluindo uma queda de 36% no ano passado, de acordo com a empresa de análise de dados Cannabis Benchmarks.

‘Gasto bem menos’

Em uma viagem recente ao Lower East Side, onde bongs e cachimbos decoram várias vitrines, o preço de um oitavo de onça começa em US$ 30 para variedades de qualidade média. Pré-enrolados e cartuchos vape abaixo de US$ 20 são vendidos em bodegas de esquina. E a palavra na rua é que os traficantes da cidade têm produtos de cannabis a partir de US$ 8.

“Se você administra uma loja, precisa estar ciente de quais são os preços do cara que vende na rua em Washington Square Park para ser competitivo”, disse Adam Koh, diretor editorial da Cannabis Benchmarks.

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Para Nami Saito, os preços mais baixos significam grandes economias. Em 2020, a jovem de 26 anos gastaria US$ 50 por um oitavo de onça (menos de quatro gramas) com uma compra mínima de US$ 120 por meio de um dos serviços de entrega do mercado negro da cidade.

Agora, ela pode obter a mesma quantidade de maconha e um pré-enrolado grátis por apenas US$ 30 em uma tabacaria na rua em Chinatown.

“Estou gastando bem menos com maconha do que no ano passado e fumando a mesma quantia”, disse Saito, que gasta US$ 120 por mês com maconha – a mesma quantia que costumava gastar em uma semana. “Juro que os oitavos de onça são maiores agora e são mais baratos.”

Os preços baixos e a proliferação de vendedores estão colocando o mercado legal em desvantagem antes mesmo de começar. Embora as autoridades tenham prometido reprimir as lojas não licenciadas, será difícil controlar o mercado paralelo.

Koh, da Cannabis Benchmark, estima que as vendas recreativas legais do estado de Nova York totalizarão apenas US$ 1,5 bilhão do mercado total estimado de US$ 7 bilhões em 2023.

Esse não é um fenômeno novo. Os mercados cinzas explodiram em outras jurisdições, como Califórnia e Canadá, após a legalização, mas antes que as autoridades pudessem estabelecer normas para o varejo. Assim como o que está acontecendo agora em Nova York, houve longos períodos em que a posse e consumo de maconha eram legalizados, mas não havia como comprá-la legalmente.

“Não é que o mercado de cannabis esteja crescendo – está sendo infiltrado pelo mercado ilícito antes que as lojas licenciadas abram”, disse Matt Hawkins, fundador da empresa de empreendimentos de cannabis Entourage Effect Capital.

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