Visa quer ser empresa de tecnologia e traça futuro das maquininhas, diz CEO

EXCLUSIVO: Novo líder da operação brasileira, Nuno Alves, fala sobre reposicionamento e o foco em pequenos e médios negócios

Empresa de tecnologia e pagamentos além do cartão (Visa - Divulgação)
Por Angelica Mari
03 de Novembro, 2021 | 07:35 AM

Bloomberg Línea — Em meio a um efervescente setor de pagamentos, a Visa se movimenta para reforçar a percepção no mercado de que é muito mais do que uma empresa de cartões. Com um arsenal de tecnologias que propõem digitalizar fluxos de dinheiro, a companhia executa uma estratégia que busca transpor barreiras de adoção, sobretudo entre pequenas e médias empresas.

Fazer o brasileiro deixar de usar o dinheiro vivo para pagar por produtos e serviços é a principal missão do novo country manager da gigante de pagamentos digitais no Brasil, Nuno Lopes Alves. Anteriormente responsável pela operação da companhia em países andinos, o executivo assumiu a liderança da subsidiária brasileira em junho deste ano, com um discurso que ele mesmo descreve como “bastante ambicioso.”

“Nosso propósito renovado é ser uma rede que trabalha para todos, em todos os lugares. Estamos cada vez mais empenhados em trazer inovação e aportar tecnologia de ponta, assim como segurança de última geração, para fazer a movimentação segura de dinheiro”, diz o executivo, em entrevista à Bloomberg Linea.

Segundo Alves, a ênfase na movimentação de dinheiro, ao invés de pagamentos, é um ponto crucial da visão da companhia, que tem parceria com 15,5 mil instituições financeiras no mundo, para as quais atualmente processa cerca de US$ 12,2 trilhões por meio de sua infraestrutura. A Visa vê uma oportunidade de converter US$ 18 trilhões em consumo de meios físicos, como dinheiro em espécie, para meios digitais.

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Este objetivo orienta uma campanha global de reposicionamento de marca que, segundo Alves, é o maior investimento em marketing feito pela empresa na última década.

“Cada vez mais estamos presentes em novos fluxos de pagamentos entre pessoas, entre negócios, entre governo e pessoas, com uma tecnologia que permite abraçar muito mais casos. Nosso posicionamento é ser uma rede de redes”, diz o executivo, acrescentando que as inovações que a Visa desenvolve para si tem sido aproveitadas por outros setores, desde serviços transacionais e de monetização de dados para segurança, até gestão de fraude e infraestrutura de programas de fidelidade.

O desafio dos pequenos negócios

A proposta de valor da Visa está clara para os grandes clientes corporativos, como emissores e adquirentes, diz o CEO. Por outro lado, este entendimento ainda precisa avançar entre consumidores finais e principalmente pequenas e médias empresas (PMEs). A intenção global da companhia é digitalizar os pagamentos de 50 milhões de empresas neste segmento.

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No Brasil, o potencial mercado endereçável é um universo de aproximadamente 8,5 milhões de negócios, número que representa a base nacional de PMEs e 99% dos negócios no país, segundo dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

A empresa de pagamentos também deve aproveitar o aumento da base de consumidores que passaram a comprar online na pandemia. Cerca de 13 milhões de brasileiros adentraram o universo do e-commerce em 2020, segundo pesquisa da Ebit Nielsen, alta de 29% ante 2019.

Para aumentar a participação da empresa nas finanças das PMEs, a estratégia passa por desconstruir a associação imediata da empresa a cartões. “Queremos que pequenos negócios entendam que podem se empoderar digitalmente usando credenciais digitais, e mostrar que somos a tecnologia que viabiliza estas conexões,” pontua.

Alves cita dados da própria Visa, que sugerem que 40% das micro e pequenas empresas brasileiras passaram a aceitar algum tipo de pagamento digital desde a emergência da pandemia. Por outro lado, estes negócios enfrentam dificuldades para se modernizar.

Um estudo da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial e Fundação Getúlio Vargas sugere que 66% das PMEs brasileiras ainda estão em um estágio incipiente de digitalização, por motivos como a falta de recursos financeiros e de conhecimento sobre o tema.

O líder da operação brasileira da Visa pretende responder a este cenário “com muita simplicidade”, e a visão envolve a eliminação de complexidades associadas a, por exemplo, terminais de pagamento. Adquirentes parceiras da Visa já se movimentam neste sentido: em agosto, a Stone lançou o TapTon, aplicativo que transforma o celular em uma máquina que recebe pagamentos de certão de débito e crédito, com pagamentos por aproximação.

A maquininha precisa ser enviada para um determinado lugar e ser ativada, além de [demandar] todo um comportamento de adoção de tecnologia que pode intimidar algumas pessoas. Por outro lado, as pessoas estão bastante familiarizadas com o celular”, pontua o executivo. “[Permitir que usuários] baixem um app e iniciem uma aceitação [de pagamentos] é um dos caminhos de diminuir muito as barreiras de adoção.”

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“Em nossa visão de futuro, comércios não terão mais que buscar uma maquininha para aceitar pagamentos”

Nuno Lopes Alves, country manager da Visa no Brasil

WhatsApp Pay

Um exemplo de fluxo de pagamento habilitado pela Visa e que tem o potencial descrito por Alves é o WhatsApp Pay, plataforma da qual a empresa é uma das parceiras. No entanto, a adesão à ferramenta tem progredido a passos lentos.

Segundo uma pesquisa do MobileTime e OpinionBox de setembro deste ano, apenas 7% dos brasileiros instalaram o recurso. Entre os principais motivos citados para o desinteresse, está a desconfiança em relação aos dados que precisam ser inseridos para o uso do serviço.

O serviço, relançado em maio deste ano, ficou suspenso por quase um ano. Em junho de 2020, o Banco Central anunciou que o serviço precisava ser reavaliado em relação a eventuais riscos, e afirmou que a ferramenta poderia trazer “danos irreparáveis” à privacidade, bem como à concorrência.

À época do relançamento, a Visa ressaltou que sua tecnologia de tokenização protege as transações no WhatsApp Pay, substituindo informações sensíveis do portador de cartão por um token – ou identificador digital – exclusivo que pode ser armazenado em segurança na nuvem.

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Segundo Alves, a adoção em escala do mecanismo de pagamento do Facebook está diretamente ligada à adesão de mais participantes do ecossistema de pagamentos, como bancos, e este processo está em curso.

“Para escalar o WhatsApp Pay, temos todo um trabalho de casa [em relação a] segurança que vai oferecer essa conveniência. Temos que garantir que todo o ecossistema está pronto, e vejo isso está acontecendo”, pontua o executivo.

O country manager rechaça qualquer possibilidade de jogar a toalha em relação ao WhatsApp Pay: “Estou absolutamente confiante. Já conseguimos recrutar participantes suficientes e ter as condições de sustentação: é como construir um edifício, em que as fundações precisam estar firmes. A segurança e a experiência [do usuário] são elementos cruciais dessa construção”, pontua.

Para fazer com que mais empreendedores adotem pagamentos digitais, o plano da Visa inclui um pilar de capacitação de pequenas e médias empresas. Um exemplo de iniciativas nesta frente é uma parceria da companhia com a Rede Mulher Empreendedora para um programa de aceleração focado em mulheres negras. Temas abordados incluem educação financeira e estruturação e gestão de fluxos de caixa, bem como formas de desenvolver ofertas e expor produtos online.

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“Não basta dar ferramentas tecnológicas para as pessoas, é preciso dar os meios para que elas maximizem os recursos que receberam”

Pagamentos em toda a parte

As conexões promovidas pela Visa podem se manifestar através de diversos canais que viabilizam a movimentação de dinheiro, incluindo apps, dispositivos vestíveis como smartwatches ou serviços digitais, como Netflix e Spotify, além de físicos, como no caso do plástico.

“Gosto de pensar que a movimentação digital de valores é parte integrante de uma transformação digital. Já não usamos mais CDs e sim serviços de streaming, não pedimos taxi pois com um toque de um botão em um app, o Uber aparece na nossa porta: essa mudança jamais seria completa se eu tivesse que interromper esse experiência digital e pegar a carteira para pagar com uma nota”, diz o executivo.

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Neste contexto, uma das tendências em que a Visa aposta é a proliferação de credenciais de pagamento, através da tecnologia de tokenização. “Fazemos com que as credenciais apareçam em todas as experiências: no carro, na geladeira, nas assistentes de voz, em apps. Quanto mais serviços digitais adotarem nossas credenciais, mais rapidamente o pagamento deve desaparecer na experiência de consumo”, aponta Alves.

Em um futuro próximo, que já existe mas não em escala, sua geladeira saberá seus hábitos de consumo e terá autorização para fazer as compras. Os produtos simplesmente aparecerão em sua casa.”

A adoção a experiências de compra sem atrito deve acontecer através da adesão de organizações com grandes bases de clientes, em setores como transporte público. O metrô do Rio de Janeiro, que adotou a tecnologia de pagamentos por aproximação da Visa nas catracas, é um exemplo de projeto pensado para aumentar a adoção de credenciais de pagamentos digitais entre consumidores finais.

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O caso de uso em transporte é um dos que mais gosto, pois recruta muitos usuários para o nosso propósito”, argumenta Alves. “No metrô, a pessoa não precisa mais pegar fila para comprar o bilhete, pois basta tocar [o dispositivo móvel ou vestível] na catraca. Logo, percebe que pode pagar pelo fast-food da mesma forma, ao invés de ir ao caixa sacar dinheiro: o usuário passa a entender que pode usar essa credencial em vários lugares.”

Apesar do território ainda amplamente inexplorado quando o assunto é pagamentos digitais, Alves diz que a Visa enxerga o Brasil como uma “combinação feliz de escala e de certa sofisticação”, já que o brasileiro é aberto a inovações tecnológicas e as adota rapidamente.

Indicadores de sucesso para o novo CEO da Visa no próximo ano serão, segundo ele próprio, uma ampla adoção do WhatsApp Pay, e ver a empresa colher os frutos de sua nova estratégia. “Queremos ter mais lançamentos com clientes novos e tradicionais, e avançar em nosso reposicionamento. Estamos trabalhando muito para que este nosso novo propósito seja cada vez mais visível no mercado,” conclui.

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