Regulamentação do mercado cripto pode reduzir crimes com ativos digitais

Agentes de segurança pública dizem que criação de normas ajudaria no combate a organizações criminosas

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Por Gino Matos, para Mercado Bitcoin

São Paulo - A ausência de um ambiente regulatório para o mercado de criptomoedas não reduz apenas a atratividade dos ativos digitais para investidores. O tema, que ganha cada vez mais relevância, também dificulta as operações de combate a organizações que usam criptomoedas para fraudes, lavagem de dinheiro e outras operações ilícitas, como as pirâmides financeiras, na avaliação de alguns agentes de segurança pública.

Para Filipe Hille Pace, delegado federal e chefe da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros da Polícia Federal do Paraná, “algum tipo de regulamentação é necessário”, diz, para impedir que esse vácuo regulatório se transforme em oportunidade para o crime com criptoativos. Ele cita as pirâmides financeiras, que se alastram pelo país e configuram crime contra a economia popular. Pace ressalta que a regulamentação facilitaria o rastreio desses crimes pela Polícia Federal.

A criação de uma legislação que ajude não apenas a proteger investidores e operadores de mercado também se mostra fundamental para que os agentes de segurança pública consigam agir efetivamente dentro dos campos penal e processual penal, na avaliação do também delegado Vytautas Zumas, da Polícia Civil de Goiás e criador do Núcleo de Operações com Criptoativos (NOC) do Ministério da Justiça.

Com o respaldo de uma legislação concreta do mercado de criptoativos a repressão aos crimes, segundo Zumas, “será eficiente do começo ao fim, evitando que as autoridades ajam sobre o ‘fio da navalha’ diante da falta de legislação adequada”. O delegado defende também a adoção, junto com a regulamentação específica para esse mercado, de ferramentas legais que ajudem no cumprimento da lei.

Zumas compartilha o entendimento de Pace de que a regulamentação não deve impedir o desenvolvimento do ecossistema de moedas digitais. “É certo que o legislador precisa compreender que a regulação acerca do tema deve ocorrer de forma a abarcar a escalabilidade e maleabilidade que os criptoativos imprimem em nosso dia a dia”.

Discussão antiga e controversa

A discussão sobre a regulamentação de criptomoedas no Brasil e em vários outros países onde ganha destaque é antiga e ao mesmo tempo polêmica. Enquanto uma parte dos entusiastas do ecossistema de criptoativos defende que os ideais libertários inerentes ao Bitcoin seriam feridos por um conjunto de normas, outra parte salienta que a presença de um regramento mínimo e claro auxiliaria no crescimento do mercado.

“É importante ressaltar que os criptoativos, hoje, correspondem a uma infinidade de possibilidades que vão muito além do que a ‘versão puramente peer-to-peer de dinheiro eletrônico’ idealizada por Satoshi Nakamoto”, afirma o delegado Zumas.

Desde a criação do Bitcoin, por Nakamoto, em 2009, o mercado financeiro baseado na descentralização criou ramificações cujas regras existentes na legislação não conseguem acompanhar completamente por analogia. O ramo das finanças descentralizadas, também conhecido como DeFi, é um exemplo. A tokenização de ativos, criação de entes autônomos descentralizados, e automatização de empréstimos por meio de contratos inteligentes são um terreno ainda intocado pelos legisladores.

Uma vez que essas funcionalidades financeiras se relacionam e podem revolucionar outras áreas das relações sociais, Zumas avalia que a regulamentação das criptomoedas deve ir além do foco financeiro e aborde a blockchain como ferramenta de mudança social.

No Brasil, os projetos de lei PL 4207/20 e o PL 3825/19 são os mais avançados em termos de aprovação. Ambos se encontram atualmente na relatoria da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal. O PL 4207/20, de autoria da senadora Soraya Thronicke (PSL/MS), trata das instituições cujos modelos de negócio envolvem criptomoedas, como serviços de custódia e negociação, além de prever aumento de pena para o crime de ‘pirâmide financeira’.

Já o PL 3825/19, de autoria do senador Flávio Arns (Rede/PR), propõe a regulamentação do mercado de criptoativos no Brasil e esclarece conceitos e diretrizes para exchanges. Também estabelece penalidades claras para os casos de descumprimento das normas previstas na proposta legislativa.