Nos EUA, poupanças em cripto oferecem juros altos e viraram preocupação de reguladores

A taxa de juros oferecida por empresas como a BlockFi chega a 7% contra uma média 0,06% anuais numa poupança tradicional nos EUA. Reguladores alertam para risco de perdas para investidor

Por

Bloomberg — Reguladores estaduais americanos estão preocupados com os riscos de contas de poupança de criptomoedas, que pagam juros até 100 vezes mais altos que poupanças tradicionais, e que não têm lastro em títulos registrados.

Um dos problemas é que as plataformas não revelam devidamente seus riscos aos investidores, segundo reguladores que moveram as ações. Os reguladores financeiros dos estados de New Jersey, Alabama e Kentucky já entraram com ações contra a BlockFi Lending LLC e suas afiliadas. É a mais recente faceta da crescente indústria de criptoativos a atrair o escrutínio do governo.

A BlockFi oferece rendimentos sobre o Bitcoin depositado e outras criptomoedas, em alguns casos, as chegam a taxas de juros anuais de mais de 7% sobre “stablecoins” em dólares americanos. A taxa de juros média dos EUA para contas de poupança é de 0,06%, segundo pesquisa do Bankrate.

Alguns reguladores disseram à Bloomberg que estão buscando informações de outras empresas de criptomoedas que pagam juros – seus nomes não foram mencionados à reportagem – e que podem tomar ações semelhantes às que moveram contra a BlockFi.

Algumas empresas que pagam juros sobre criptomoedas se apresentam como uma alternativa aos produtos financeiros tradicionais. A Gemini Trust Co., fundada por Cameron e Tyler Winklevoss, por exemplo, diz que sua Gemini Earn oferece “até 100 vezes a taxa de juros média nacional”, comparando-a com contas de poupança bancárias cujos depósitos são segurados pelo governo federal.

As empresas que oferecem as contas, incluindo Gemini e outras, como Celsius Network LLC e BlockFi, reconhecem em suas divulgações que suas contas não incluem esse seguro.

Alguns reguladores dizem que as empresas de criptomoedas não estão fazendo o suficiente para alertar sobre os riscos de os investidores perderem seu principal e que as contas parecem semelhantes a títulos que precisam ser registrados em nível estadual ou federal.

Sem seguro federal, os investidores podem perder seu dinheiro se as empresas de criptomoedas não puderem pagar esses depósitos.

Em julho, cinco reguladores de valores mobiliários do estado moveram ações contra a BlockFi e suas afiliadas, com sede em Nova Jersey, ordenando-lhe que fornecesse mais informações sobre suas contas ou, nos casos de Nova Jersey e Kentucky, parasse de oferecer alguns produtos no estado. O estado de Nova Jersey atrasou a implementação de sua ordem e, na quarta-feira, anunciou que a BlockFi teria até o final de setembro para cumpri-la.

A BlockFi afirmou um comunicado que estava conversando com reguladores e que acreditava que suas contas de juros são “legais e apropriadas para participantes do mercado de criptomoedas. Continuamos firmes em nosso compromisso de lutar pelos direitos dos consumidores de ganhar juros sobre seus ativos de cripto.”

No caso da BlockFi, “o que nós, reguladores, vimos foi uma empresa prometendo pagar aos investidores altas taxas de retorno em um ambiente amplamente não regulamentado”, afirmou Joe Rotunda, diretor da divisão de fiscalização do Texas State Securities Board. “Não estávamos convencidos de que um regulador federal em um futuro próximo faria algo para ajudar a proteger os clientes dessas empresas. Sentimos que precisávamos agir.”

Rotunda disse que sua agência e as de outros estados estão procurando empresas com modelos de negócios comparáveis com o objetivo de enfrentá-las com ações semelhantes.

As contas de cripto com juros proliferaram no ano passado. BlockFi, um dos primeiros participantes, diz que tem mais de US$ 10 bilhões em criptomoedas depositadas, ganhando um rendimento percentual anual de até 8%. A Celsius diz ter US$ 20,5 bilhões em “ativos da comunidade”, enquanto a Gemini lançou essas contas em fevereiro e na segunda-feira afirmou possuir US$ 3 bilhões em depósitos.

Os reguladores federais ainda não fizeram movimentos substanciais contra as contas de poupança de criptomoedas, mas voltaram seus olhos para o mercado de moeda estável.

A secretária do Tesouro, Janet Yellen, expressou preocupação de que essas moedas possam representar um risco para o sistema financeiro ou ser usadas para escapar da aplicação da lei. O órgão federal (equivalente ao Ministério da Economia no Brasil) planeja se reunir com empresas de criptomoedas e grupos de negócios bancários nesta semana para falar sobre as preocupações, de acordo com uma fonte a par do assunto.

Os produtos oferecidos por empresas como BlockFi e Gemini são centralizados nas empresas. Os reguladores também disseram que estão preocupados com os rendimentos oferecidos por meio de “finanças descentralizadas”, ou DeFi, onde os empréstimos são concedidos entre usuários de criptomoedas sem um intermediário.

Para os consumidores, as contas são atraentes. Na Gemini, por exemplo, um investidor pode comprar “dólares Gemini”, um stablecoin com um preço fixo de US$ 1, mantê-lo em depósito e obter um rendimento anualizado de 8,05%. A empresa oferece taxas igualmente altas em dezenas de outras criptomoedas, incluindo aquelas como Bitcoin, onde o preço subjacente pode subir ou cair. Os juros são pagos na forma da criptomoeda que depositada.

Alguns reguladores dizem que estão preocupados que os investidores nem sempre sejam informados para que seus depósitos são usados, em que circunstâncias eles poderiam perder parte ou todo o seu principal e como as empresas de criptomoedas estão ganhando dinheiro elas mesmas. Muitos, se não a maioria, dos produtos devem ser registrados junto aos reguladores de valores mobiliários, disseram eles.

“A questão é que precisamos saber o que eles estão fazendo com o Bitcoin de todo mundo e para onde o dinheiro está indo e ter alguma regulamentação que responda por isso”, disse Joseph Borg, que chefia o regulador de valores mobiliários do Alabama e diz que o estado está investigando vários outros firmas com atividades semelhantes.

“Você sabe o que acontece se uma dessas coisas falhar? As pessoas vão ligar para meu escritório e perguntar: ‘Por que você não fez algo?’”, segundo Borg.

As empresas que oferecem contas de cripto de juros têm vários níveis de divulgação sobre quanto risco seus investidores estão assumindo. A Gemini diz que fez uma parceria com a firma de investimento em criptomoedas institucional Genesis Global Trading Inc. para oferecer as contas e que os depósitos estão sendo emprestados a investidores institucionais.

A própria Gemini recebe uma parte, às vezes ficando com quase metade dos juros que seus parceiros pagam, de acordo com sua tabela de honorários. A divulgação de risco diz que a empresa “implanta criptoativos detidos por ela em uma variedade de atividades de geração de receita, incluindo emprestá-los a terceiros e transferi-los para plataformas e sistemas externos”.

Ambas as empresas reconhecem em suas divulgações que as contas não possuem nenhum seguro semelhante a contas de poupança bancária e que os investidores podem perder dinheiro.

Uma porta-voz da Celsius não quis comentar.

“Eles usam essa terminologia que sugere que é como um depósito bancário quando não é tão seguro”, afirmou Alexis Goldstein, diretor de política financeira do Open Markets Institute que testemunhou sobre criptomoedas no Comitê de Serviços Financeiros da Câmara em junho.

O diretor de operações da Gemini, Noah Perlman, afirmou que sua empresa divulga os riscos das contas, mas que nenhum investidor perdeu dinheiro. Ele conta que a Gemini trabalha com reguladores em Nova York, onde está localizada, antes de lançar novos produtos e disse acreditar que as contas de juros da Gemini são substancialmente diferentes das contas da BlockFi.

A Gemini não divulga exatamente para que são usados os empréstimos, mas seu parceiro Genesis diz em seu site que oferece empréstimos de cripto que permitem que investidores institucionais apostem que os preços de criptomoedas cairão, para aproveitar oportunidades de arbitragem ou proteger seu risco, entre outras estratégias.

A extensão mais recente do regulador estadual de Nova Jersey dá à BlockFi até 30 de setembro para interromper a oferta de suas contas no estado ou registrá-las como valores mobiliários. Um porta-voz do regulador não quis comentar. O estado do Kentucky abriu uma ação semelhante que entrou em vigor imediatamente. Outros estados deram tempo ao BlockFi para mostrar por que eles não deveriam estar sujeitos a tal restrição.

Veja mais em bloomberg.com

Leia também

Millennial e LGBTQ, Leite luta para ser opção a Lula e Bolsonaro

Toshiba alerta sobre falta de chip de energia por mais um ano

Nova linha de relógios da Apple traz tela maior e mais dados