Bloomberg — Estados e cidades brasileiras estão se preparando para suspender a maioria das limitações a comércios e encontros, à medida que os casos e mortes por Covid atingem seu nível mais baixo em meses, com a aceleração da vacinação.
Em São Paulo, muitas escolas reabriram com capacidade total para aulas presenciais esta semana, e o estado vai acabar com as restrições de horário e capacidade para a maioria das empresas a partir de 17 de agosto. O Rio de Janeiro também tem planos de flexibilizar as regras a partir de 2 de setembro, inclusive sobre o uso de máscaras. A reabertura incluirá uma celebração de quatro dias, disse o prefeito Eduardo Paes, acrescentando que as festividades de Ano Novo serão as maiores da história da cidade.
A pressão agressiva para acabar com as restrições, em vigor há mais de 15 meses - embora com aplicação irregular e regras muitas vezes contraditórias que as tornaram menos eficazes - surge em meio a uma trégua na pandemia.
Embora o vírus ainda esteja matando quase mil pessoas por dia, isso está bem abaixo do pico de mais de 4.200 óbitos. A média móvel caiu abaixo de 1.000 pela primeira vez desde janeiro. A ocupação em hospitais também despencou, com unidades de terapia intensiva em todo o país com cerca de 60% a 65% de ocupação, contra mais de 95% no início do ano.
Todo o otimismo pode desaparecer rapidamente se a variante delta, que causou o ressurgimento do vírus na Europa e nos EUA, se espalhar pela maior nação da América Latina. Embora os especialistas digam que ainda é muito cedo para dizer se a cepa causará uma terceira onda no Brasil, a pressão para acabar com as restrições aumenta o risco.
“Temo que a população esteja muito animada com a queda nos números da Covid”, disse Pedro Hallal, epidemiologista e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas. “A delta pode ‘fazer uma festa’ e infectar muita gente.”
A delta é a variante do coronavírus mais preocupante até agora, espalhando-se para mais de 100 países desde que foi relatada pela primeira vez na Índia, em outubro. A cepa, estimada em quase duas vezes mais infecciosa que o vírus original do início de 2020, agora tornou-se dominante em muitos países, incluindo no Reino Unido e os EUA. Os lugares mais atingidos foram aqueles onde menos da metade da população adulta foi totalmente imunizada.
No Brasil, seu impacto até agora está silencioso. Os últimos dados do Ministério da Saúde mostram que o país identificou cerca de 250 casos da variante, contra 170 há uma semana. Mas o número provavelmente não reflete o verdadeiro impacto da cepa, já que o país não testa o suficiente, disse Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, conhecida como Abrasco.
A delta também enfrenta a concorrência da variante gama, inicialmente rastreada até a cidade amazônica de Manaus, que os especialistas dizem ser muito mais contagiosa do que a cepa original.
“A gama é tão preocupante quanto a delta e segue forte no Brasil”, disse Marcelo Paiva, professor da Universidade Federal de Pernambuco e pesquisador da Fiocruz, que faz estudos para rastrear o vírus. “A introdução de uma nova variante na mistura apenas destacará nossa lenta campanha de imunização.”
Embora o ritmo das vacinações tenha melhorado, com mais da metade da população agora inoculada com uma dose, apenas 20% foram totalmente imunizados. Isso porque as doses de duas das vacinas disponíveis no Brasil - AstraZeneca e Pfizer - estão sendo administradas com três meses de intervalo. As doses da CoronaVac, que respondem por cerca de 37% das vacinas implantadas, são administradas com um mês de intervalo.
Dados iniciais sugerem que haverá diferenças na eficácia dependendo das vacinas. Uma pesquisa da Public Health England divulgada antes da revisão por pares descobriu que duas doses da vacina AstraZeneca, que está sendo amplamente usada no Brasil, foram menos eficazes na prevenção de da variante delta em comparação com a dose dupla da vacina Pfizer. Dados da Indonésia, que está usando principalmente o CoronaVac, sinalizaram uma prevalência mais baixa de mortes entre os vacinados.
O Brasil deveria ter pelo menos 70% da população totalmente imunizada para ter uma posição mais confortável em relação à delta, disse Silva, que também é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. O Ministério da Saúde estima que metade da população adulta terá recebido duas vacinas em setembro.
Fernando Spilki, pesquisador da Covid do Ministério da Ciência e Tecnologia, disse que o Brasil deveria se concentrar em encurtar o período entre as vacinas para imunizar totalmente o maior número possível de pessoas e evitar que a variante delta se espalhe. As autoridades anunciaram recentemente que estão considerando reduzir o período entre as vacinas da Pfizer para 21 dias, mas somente depois que toda a população com mais de 18 anos tenha recebido a primeira dose.
Por enquanto, os especialistas recomendam cautela. A variante foi encontrada em todo o país, incluindo os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Ceará. Embora a mobilidade não tenha voltado aos níveis pré-pandêmicos, os restaurantes nas grandes cidades estão regularmente lotados e, por exaustão ou tédio, os brasileiros estão se arriscando e viajando, fazendo com que a inflação de serviços salte.
“Mesmo com uma queda nos casos e mortes, o vírus ainda está circulando amplamente”, disse Spilki. “Ainda há o risco de vermos um pico se as pessoas não se protegerem.”
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