(Bloomberg Opinion) Com a volatilidade das criptomoedas devendo persistir – o bitcoin, por exemplo, foi negociado numa faixa de US$ 30 mil a US$ 44 mil -, mais pessoas estão se perguntando se isso não pode significar problemas para outros ativos financeiros como as ações e os bônus. A resposta a esse “crypto contágio”, se considerada de uma forma estrita, é não. Mas no contexto mais amplo de mercado, ela fica mais complicada, especialmente em vista da posse cruzada de ativos, alavancagem e funcionamento do mercado.
Eis quatro questões sobre contágio que os investidores precisam considerar:
A volatilidade das criptomoedas continuará?
Sim. A provável persistência da volatilidade se deve a um cabo-de-guerra que se tornará mais tenso e multidimensional.
Um aspecto notável das criptomoedas neste ano, e especialmente do bitcoin, tem sido a atração competitiva entre e dentro dos setores privado e público. Esse fenômeno deverá se intensificar nos próximos meses, com cada lado passando por sua evolução longe de linear.
Até os últimos dez dias, o setor privado vinha alimentando o que pareceu ser um processo acelerado de autofortalecimento da adoção mais ampla do bitcoin como forma de pagamento e reserva de valor. O ímpeto mais visível ocorreu em fevereiro, quando Elon Musk anunciou que a Tesla havia investido parte de seu dinheiro em bitcoins e também o aceitaria como pagamento por seus carros.
Isso encorajou outras companhias a fazer o mesmo, elevando mais o preço do bitcoin e atraindo mais investidores. Com os não tradicionais provedores de plataformas de negociação de criptomoedas prosperando como resultado – como a listagem direta da Coinbase na Nasdaq -, mais corretoras tradicionais tentaram participar, oferecendo seus próprios veículos aos investidores interessados.
Esse impulso aparentemente irrefreável foi abalado na semana passada não só pelas dúvidas sobre a continuidade do entusiasmo de Musk e da Tesla, mas também por uma oposição do setor público que vem ganhando magnitude e crescendo em escala.
Muitos governos e bancos centrais continuam preocupados com os riscos que as criptomoedas representam à segurança nacional e à estabilidade econômica e financeira. Preocupações antigas têm se concentrado na facilitação de pagamentos ilícitos, proteção fraca aos investidores, a possibilidade de corrosão da eficácia da política monetária e a perda da senhoriagem que vem com a emissão disseminada e uso de moedas concorrentes.
Vários países, incluindo alguns grandes com significativos efeitos de demonstração internacional, como a China e o Reino Unido, estão agora investigando mais seriamente a emissão de moedas digitais por seus bancos centrais, ou o que alguns classificam como criptomoedas centralizadas. Quanto mais eles avançam nisso, maior a propensão de eles terem e abrir espaço para suas próprias moedas digitais, impondo uma pressão reguladora sobre a atratividade e viabilidade de variantes descentralizadas como o bitcoin. Na verdade, essa pode ser a motivação por trás das medidas recentes da China contra o bitcoin.
Há uma forte ligação formal entre as criptomoedas e as classes de ativos mais tradicionais?
Como um todo, não. Elas tendem a viver em seus próprios ecossistemas, pelo menos por enquanto.
Com base em seus atributos básicos, as criptomoedas não são substitutos físicos nem financeiros das ações, bônus e commodities. Embora seus defensores mais ruidosos destaquem seu papel de moeda global descentralizada que vai proliferar rapidamente nos ecossistemas de pagamentos e poupança, a capacidade de fazer isso exige o tipo de maturação institucional e estabilidade relativa dos preços que levarão anos para serem estabelecidas. Além disso, as criptomoedas terão de encontrar uma solução para o problema do alto consumo de energia.
Há canais informais de contágio?
Sim, vários, e eles vêm crescendo na medida em que a alavancagem aumenta.
Com os bônus soberanos oferecendo rendimentos miseráveis, além de perspectivas de preços assimétricas e desfavoráveis, alguns investidores têm visto as criptomoedas como uma maneira melhor de diversificar ativos por causa de suas exposições muito maiores em ações e equivalentes de ações. Outros vêm optando por investir em plataformas de criptomoedas como parte de seus posicionamentos de carteira.
O risco de contágio aumenta na medida em que as posições cruzadas crescem nas carteiras de mais investidores, especialmente quando os operadores estão alavancados, como alguns estão agora, e a infraestrutura operacional que apoia os negócios com criptomoedas é pressionada, como aconteceu na semana passada. Lembre-se de que a história financeira é cheia de exemplos de como investidores incapazes de vender o que eles querem vender – para proteger suas carteiras, levantar dinheiro ou ambos -, com frequência acabam vendendo outras posições com atributos muito diferentes. Com isso vem um risco maior de transbordamento financeiro.
Não muito, numa base individual, mas mais eminente quando julgado com as outras coisas que estiverem acontecendo nos mercados.
As posições em bitcoins não estão suficientemente institucionalizadas, pelo menos ainda não, para constituir um risco sistêmico individual. Muitos bancos parecem ter de pouca a nenhuma exposição nos seus balanços. Sendo assim, um pico na volatilidade teria poucos efeitos diretos de contágio. Isso é uma boa notícia.
Uma notícia menos boa é que a alta dos preços dos bitcoins – que ainda mostram uma valorização de mais de 250% nos últimos 12 meses, apesar da queda nas últimas cinco semanas de US$ 63.000 para menos de US$ 40.000 – tem sido parte de um “rali de todas as coisas”, movido pelo fornecimento contínuo, pelos bancos centrais, de uma liquidez ampla e previsível. Com a dívida marginal crescendo rapidamente ao mesmo tempo, o risco de um acidente financeiro precisa ser monitorado de perto pelos participantes do mercado e as autoridades financeiras, especialmente quando tantos tentam dirigir tão rapidamente pela rodovia do risco financeiro.