Na corrida pelo super app, esta empresa avança de olho em mercado de R$ 35 bi

Em entrevista à Bloomberg Línea, Carlos Cêra, CEO e cofundador da Superlógica, conta os próximos passos da estratégia para se tornar o app líder na venda de soluções para a moradia

Carlos Cêra, CEO e cofundador da Superlógica, maior player do país no mercado de serviços de tecnologia e financeiros para condomínios (Foto: Divulgação)
06 de Maio, 2024 | 03:05 PM

Bloomberg Línea — O modelo de super app que sirva como porta de entrada e hub de produtos e serviços diversos para o consumidor foi consagrado inicialmente na China, com o WeChat, da Tencent, e o AliPay, do Ant Group, do Alibaba. Um dos racionais dessa tese é que não faz sentido esperar que o usuário baixe inúmeros aplicativos para fazer diferentes serviços se puder unificá-los de alguma forma.

No Brasil, Nubank (NU) e Mercado Livre (MELI) são dois dos players que lideram essa corrida, com serviços que já vão muito além do financeiro e do e-commerce que caracterizaram seus primeiros anos. Há outros que avançaram pelo financeiro ou coalizão, como Inter (INTR) e Dotz (DOTZ3), respectivamente. Mas há espaço para o avanço de empresas dedicadas a indústrias específicas da economia.

Essa é a visão da Superlógica - empresa que é investida do Warburg Pincus (WP), fundo global de private equity -, que atua como uma plataforma financeira e de tecnologia para administradoras de condomínios e que já conta um market share estimado em 50%, com uma operação rentável e que gera caixa.

O próximo grande objetivo é se tornar o grande super app para casa, condomínio e vizinhança do país, com a oferta de produtos e serviços de diferentes áreas e fornecedores. Hoje existem diferentes aplicativos que se dedicam a partes da jornada e que não se “conversam”, o que exige que o morador baixe todos para fazer uso dos serviços - algo que, muitas vezes, sequer acontece.

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“Sendo o super app da casa, vamos participar de todas os grandes movimentos e oportunidades relacionadas. Há muita avenida de receita. E nosso valor vai ficar mais evidente”, disse Carlos Cêra, CEO e cofundador da Superlógica, em entrevista à Bloomberg Línea.

Esse aplicativo único atenderá, quando completo, diferentes necessidades, como, por exemplo, serviços que vão da pesquisa de um novo lugar para morar até atividades mais cotidianas como ser apresentado para os vizinhos ou contratar um serviço de manutenção para a sua casa. E também serviços financeiros, como seguro residencial.

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É um mercado endereçável de R$ 35 bilhões, segundo estimativas de um banco de investimento. Com mais de um ano de operação do super app, já tem sido possível fazer um diagnóstico e prever quais os próximos passos de desenvolvimento.

O super app, anunciado no fim de 2022 com a Cyrela e a Intelbras como sócios minoritários e com o nome Gruvi, tem sido “escalado” gradualmente desde então em cima da base de mais de 100 mil condomínios já “plugados” à plataforma, que transacionou cerca de R$ 35 bilhões no ano passado (a projeção era chegar ao fim do último ano com cerca de um terço da base, número não confirmado).

“Já temos muitos produtos. O plano é aumentar o número de parceiros de diversas áreas para essa ‘prateleira’ de forma relevante. Há muitas oportunidades, como, por exemplo, essa onda de geração de energia renovável. Temos uma capacidade única de distribuição”, disse.

Hoje é possível consolidar despesas com a casa, como contas de luz, água e gás, além do condomínio em si. No futuro, segundo Cêra, será possível ter acesso a soluções para reduzir essas despesas e fazer comparações com os vizinhos, por exemplo.

Também estão no roadmap serviços relacionados a transações imobiliárias, como a visão da casa como um ativo financeiro que permita, por exemplo, a avaliação do seu valor de mercado e qual a liquidez.

“Quanto mais produtos colocamos, mais o churn [métrica de perda de cliente] cai, porque aumenta a satisfação do cliente e aumenta sua fidelização. Ao mesmo tempo, quanto mais completo fica o nosso portfólio, mais difícil para outras empresas competirem conosco.”

No fim do dia, a Superlógica se propõe a funcionar como um marketplace de fornecedores de serviços para os condôminos, de olho na conveniência e na gestão mais eficiente de despesas.

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Em sua última rodada de captação, há quase um ano, a empresa recebeu um aporte de R$ 150 milhões justamente do Warburg Pincus, que já havia investido R$ 300 milhões em 2020.

No ocasião, a Superlógica apresentava uma receita anualizada da ordem de R$ 330 milhões - Carlos Cêra não quis abrir dados mais recentes.

Ele disse que potenciais M&As (fusões e aquisições) seguem no radar da empresa para reforçar o negócio do super app, dentro do racional adotado por ocasião desse último aporte.

“A empresa é lucrativa e não precisa de capital. Mas entendemos que poderia fazer sentido estar ainda mais capitalizado em um momento em que outras empresas do mercado não estão tão bem, pois isso pode significar oportunidades de M&A para ajudar na estratégia do Gruvi”, disse.

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Um passo que está no horizonte, segundo o cofundador, será a abertura de capital.

Plataforma para administradoras

Enquanto o super app ganha escala, a Superlógica tem como principal negócio a plataforma que permite a gestão financeira do condomínio, com administradoras como clientes. Cuida também da gestão da portaria, ou seja, de entrada de visitantes, recebimento de encomendas etc.

No primeiro caso, a empresa oferece desde um produto de entrada, um software de gestão (ERP) em que é líder de mercado, até uma solução mais recente chamada “inadimplência zero”, em que assume esse valor em atraso e faz o repasse com um deságio para o condomínio; e busca de forma proativa reaver o que está em atraso, o que evita, por outro lado, o desgaste da cobrança para o síndico ou o administrador.

Na frente do condomínio, é possível também gerenciar tarefas como organizar assembleias virtuais e reservar áreas comuns como salões de festa.

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O papel do administrador de condomínios

Cêra explicou que o objetivo não é prescindir do administrador de condomínios, diante do entendimento de que esse é um business também de relacionamento com os próprios e o síndico.

“Na nossa visão, precisamos da administradora e isso vai continuar assim. É o modelo que nos permite ganhar escala, porque esse relacionamento com os condomínios é algo local”, afirmou.

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O CEO da Superlógica faz o paralelo, guardadas as devidas especificidades, com o papel considerado fundamental dos escritórios de assessores de investimento (ex-agentes autônomos) no mercado financeiro para o varejo, para conseguir chegar aos clientes finais que estão na ponta.

“Queremos que todas as questões relacionadas à casa estejam concentradas em um aplicativo orquestrado por uma empresa de tecnologia, que somos nós, mas por meio do administrador de condomínio”, disse. E melhorando a experiência da jornada diante das necessidades.

A origem da startup, no começo dos anos 2000, veio de um questionamento sobre por que a inovação não chegava aos condomínios. Carlos fundou a empresa junto com Luis Cêra, seu irmão, e Lincoln César.

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“A conclusão a que chegamos é que tem uma pessoa fundamental, que é o administrador de condomínio, mas que precisa evoluir a sua atuação.”

“Esse profissional deveria chegar a um condomínio e fazer um diagnóstico de segurança, conveniência etc. e daí buscar atender as necessidades. Ou seja, precisa se preparar.”

Na outra ponta, a da oferta, a avaliação era - e continua a ser - a de que o custo de aquisição de cliente (no caso, o condomínio) é muito grande para startups ou marcas que tenham a inovação de produtos e que quisessem chegar e oferecer esse ‘shopping’ de soluções.

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“E é justamente o que nos propomos a fazer, fornecendo tecnologia, gestão e o que for necessário em uma ‘prateleira’ para o administrador de condomínio”, disse. “Esse é o nosso papel: ligar as duas pontas.”

Nesse processo, o administrador, uma vez com o diagnóstico e a oferta de soluções em mãos, precisa levar a proposta para uma assembleia e convencer o síndico a comprá-las. E ‘plugá-las’ no condomínio.”

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Na visão do empreendedor, durante muito tempo, o administrador de condomínio se propôs a cumprir o papel de um contador, ao gerenciar as receitas e as despesas relacionadas. Mas as expectativas hoje são mais amplas.

“Os moradores esperam que o síndico e a administradora ocupem um papel que eles, por sua vez, não consideram que precisam fazer. E só vão conseguir cumprir com o uso de tecnologia”, disse.

Diante desse gap de expectativas, a empresa se propõe também a fazer uma espécie de “ressignificação” do que pode ser atendido por parte dos administradores de condomínios.

É um trabalho que conta com indicadores-chave que vão da redução da inadimplência à melhora do nível de satisfação dos moradores, medido por meio de pesquisas.

Cêra disse que os números da carteira da Superlógica mostram que as administradoras melhoram o nível de retenção de condomínios. As receitas destes também crescem, dado que ganham um percentual em cima dos serviços que são oferecidos aos moradores, como se fosse um supermercado.

Mais recentemente, há um mês, a empresa lançou um novo serviço, um chatbot chamado Atende, com o objetivo de personalizar e otimizar o atendimento de administradoras aos condôminos. “No fim do dia, queremos construir uma relação de longo prazo com os moradores”, disse Cêra.

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Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.