Trafigura, que admitiu propina no Brasil, aponta que fundador aprovou os subornos

Segundo a Bloomberg News, gigante de commodities admitiu à Justiça americana que fez pagamentos ilegais de US$ 19,7 mi para fechar acordos no país entre 2003 e 2014

Escritório da Trafigura na Índia: empresa admite pagamento de suborno em certos países no passado para fechar contratos
Por Jack Farchy
05 de Abril, 2024 | 12:01 PM

Bloomberg — A gigante do comércio de commodities Trafigura admitiu que seu fundador e ex-CEO Claude Dauphin aprovou pagamentos de subornos para fechar negócios de petróleo no Brasil, sendo a primeira vez que um dos líderes da indústria é implicado em uma série abrangente de casos de corrupção nos EUA.

Na semana passada, a Trafigura tornou-se a mais recente das maiores empresas comerciais de commodities do mundo a admitir o pagamento de subornos para conquistar negócios, quando se declarou culpada em um tribunal de Miami.

Os detalhes do envolvimento de Dauphin estavam contidos em uma declaração de fatos no acordo de confissão com o governo dos EUA, que a empresa admitiu ser “verdadeiro e correto”.

Dauphin, que liderou a Trafigura desde sua fundação em 1993 até sua morte em 2015, era uma figura emblemática na empresa e na indústria de comércio em geral. “É impossível exagerar a influência do caráter de Claude em moldar todos os aspectos da Trafigura”, conforme um obituário publicado pela empresa em sua morte.

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Empresa admite suborno

A declaração de fatos referia-se à conduta de vários executivos não identificados da Trafigura no período de 2003 a 2014, quando a empresa pagou aproximadamente US$ 19,7 milhões em “comissões corruptas” para fechar negócios com a Petrobras (PETR3; PETR4).

Um deles, identificado como “Executivo 1 da Trafigura”, é descrito como um cidadão francês que “foi um executivo de alto nível na Trafigura, exercendo controle substancial sobre a Trafigura e suas subsidiárias e entidades afiliadas até aproximadamente 2015″.

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Outro, identificado como “Executivo 2 da Trafigura”, é descrito como um cidadão brasileiro que “foi agente ou executivo da Trafigura e várias de suas subsidiárias e entidades afiliadas”.

E-mails citados na declaração de fatos dos EUA, em forma anonimizada, que foram divulgados integralmente em um caso civil brasileiro anterior, deixam claro que o Executivo 1 da Trafigura é Dauphin e que o Executivo 2 da Trafigura é Mariano Ferraz, ex-membro do conselho de administração e executivo sênior da Trafigura, que foi considerado culpado por acusações de corrupção relacionadas no Brasil em 2018.

A Trafigura se recusou a comentar, assim como um porta-voz do Departamento de Justiça dos EUA.

Em uma declaração que seguiu sua confissão de culpa na semana passada, o CEO Jeremy Weir disse: “Esses incidentes históricos não refletem os valores da Trafigura nem a conduta que esperamos de cada funcionário. Eles são particularmente decepcionantes dadas nossos esforços contínuos ao longo de muitos anos para incorporar uma cultura de conduta responsável na Trafigura”.

De acordo com a declaração de fatos dos EUA, os Executivos 1 e 2 da Trafigura (Dauphin e Ferraz) fizeram com que a Trafigura celebrasse um acordo intermediário segundo o qual a empresa pagaria comissões a um indivíduo identificado como “Cúmplice 2″.

Os dois executivos da Trafigura “sabiam e pretendiam que uma parte dessas comissões seria paga como subornos a funcionários estrangeiros”, diz a declaração de fatos. Em poucas semanas, a Trafigura pagou aproximadamente US$ 500.000 ao indivíduo identificado como Cúmplice 2.

Dauphin, pupilo de Marc Rich, foi o motor por trás do crescimento da Trafigura, que passou de uma pequena concorrente combativa para se tornar uma das maiores tradings de commodities do mudo.

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Fora da indústria, ele era mais conhecido por ter passado cinco meses em uma prisão na Costa do Marfim em 2006 e 2007 por causa de uma disputa envolvendo o despejo de resíduos perigosos em Abidjan.

Mas dentro da Trafigura, ele era um mentor querido que contratou muitos dos principais executivos atuais da empresa. “Para muitos funcionários, ele se tornou um mentor inspirador, até mesmo uma figura paterna”, conforme o obituário da empresa. “Seu nome será lembrado com gratidão por décadas.”

Dois executivos deixam a empresa

Após a confissão da empresa na Justiça dos EUA, a empresa anunciou que dois dos executivos mais sêniores vão deixar a companhia, em meio a uma grande reestruturação.

O diretor executivo e há muito tempo chefe de petróleo, José Larocca, se aposentará em setembro, enquanto o diretor financeiro Christophe Salmon sairá em junho, afirmou a empresa em um comunicado na sexta-feira (5).

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A saída dos dois homens, entre as figuras mais sêniores da indústria global de negociação de commodities, ocorre após um período em que a Trafigura registrou lucros recordes, mas foi abalada por erros de negociação e acusações de conduta imprópria.

Ao mesmo tempo, seus executivos têm se preparado para uma transição de gerações após uma década em que a alta gestão permaneceu estável.

Larocca, um dos executivos mais antigos da Trafigura, foi pupilo do fundador Claude Dauphin. Juntamente com o CEO Jeremy Weir e o ex-diretor de operações Mike Wainwright, ele tem sido um dos principais trios da empresa desde a morte de Dauphin, há uma década.

Salmon ingressou na Trafigura em 2012 e atuou como diretor financeiro por quase 10 anos. Ele será substituído por Stephan Jansma, atualmente diretor financeiro da empresa para a Ásia-Pacífico.

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-- Com colaboração de Archie Hunter.

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