Bloomberg Línea — Com a forte recuperação da demanda por viagens, as companhias aéreas da América Latina vêm retomando os níveis de ofertas de voos e assentos pré-pandemia e, em alguns casos, até superam os patamares de 2019, impulsionadas em grande parte pelas vendas em mercados secundários.
No entanto, por outro lado, as empresas do setor ainda enfrentam o desafio de estimular as rotas domésticas, segundo o vice-presidente regional para Américas da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA, na sigla em inglês), Peter Cerdá.
“A grande maioria dos países da região se recuperou, mas temos alguns mercados que ainda estão lutando. O desafio é o equilíbrio da conectividade internacional com a doméstica”, disse o executivo em entrevista à Bloomberg Línea.
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Segundo a IATA, a América Latina vem registrando evolução constante no desempenho financeiro desde 2020, mesmo com as variações entre os países. Em particular México, El Salvador, Guatemala e Honduras são os que mais colaboram para o aumento dos lucros da região, afirmou a entidade.
As companhias aéreas da América Latina devem registrar lucro líquido de US$ 1 bilhão em 2024, de acordo com estimativa da IATA divulgada nesta manhã de terça-feira (10). Para 2025, a entidade projeta um resultado líquido de US$ 1,3 bilhão para as empresas da região.
A IATA destacou que as depreciações cambiais em alguns países da região com operações domésticas significativas trouxeram muitos desafios, já que os principais custos, como despesas de frota e serviço de dívida, são pagos em dólares americanos.
“Espera-se que a lucratividade melhore em 2025, à medida que as transportadoras emergem da reestruturação do Chapter 11 [equivalente à recuperação judicial] com mais competitividade, e que as taxas de câmbio caminhem para uma direção favorável às aéreas da região”, afirmou a IATA.
Cerdá disse que o mercado do México, por exemplo, continua a crescer, assim como o da República Dominicana. “Vimos números recordes na Colômbia, que teve um ano muito forte.”
Segundo ele, o grande destaque da região fica com a Argentina, cujo governo implementou mudanças no setor, como, por exemplo, a política “open skies”, que, entre outras iniciativas, removeu regras de controle de preços das passagens e de rotas operadas por companhias estrangeiras. Isso estimulou a chegada de novas aéreas ao mercado local, antes dominado pela estatal Aerolíneas Argentinas.
“O vencedor deste ano, com certeza, é a Argentina, porque o país implementou uma série de mudanças com a política ‘open skies’. Já estamos começando a ver os frutos com mais companhias aéreas entrando no mercado argentino”, observou.
Ele afirmou que os mercados secundários da região — que não são os destinos mais procurados – têm puxado o crescimento do setor de aviação em 2024.
Na Colômbia, por exemplo, Medellín e Cali são destinos em expansão. Já na Argentina, para além de Buenos Aires, opções como Rosário e Bariloche vêm se destacando.
No Brasil, um destino secundário em expansão é Brasília, disse Cerdá. “Embora seja a capital da maior economia da região, por muitos anos não teve conectividade com outras capitais da América Latina. E agora tem”, afirmou.
Ele acrescentou que, globalmente, muitos mercados secundários ainda são mal servidos. “A América Latina continua a se desenvolver não apenas a partir de hubs, e acredito que existe muito potencial de conexões na região.”
Globalmente, a IATA espera que o lucro líquido das companhias aéreas atinja US$ 36,6 bilhões em 2025, ante US$ 31,5 bilhões estimados para este ano.
As receitas totais do setor no mundo em 2025 devem alcançar US$ 1,007 trilhão pela primeira vez na história. Se confirmado, o resultado representa um crescimento de 4,4% em relação a 2024.
Crise da indústria
Atualmente, as companhias aéreas têm o desafio de renovação de frota, diante da crise no fornecimento de motores e outras partes da indústria aeronáutica.
Recentemente, o CEO da Azul (AZUL4), John Rodgerson, disse que a crise de fornecimento de peças e motores é “mundial” e que todas as fabricantes da indústria – Airbus, Boeing e Embraer – estão “com pedidos atrasados”.
“Todo mundo quer voar mais e diluir os custos fixos porque a demanda está forte, mas o problema de suprimento global vai perdurar uns dois ou três anos, no mínimo”, afirmou o executivo a jornalistas no último mês.
Para Cerdá, este é um período de grandes desafios para as aéreas. “Há um acúmulo de aviões que não foram entregues e o backlog [carteira de pedidos das aéreas] está crescendo”, alertou o dirigente.
Em meio a desafios permanentes, principalmente após a pandemia, as empresas do setor buscam formas de se reestruturar, seja refinanciando dívidas, como fez a Azul, ou por meio de recuperação judicial, como fizeram a Latam (LTM), em 2020, e a Gol (GOLL4), em 2024, ao aderir ao Chapter 11 nos Estados Unidos.
Cerdá disse que o setor está em constante transformação. “Quem saiu do Chapter 11 se tornou mais forte para competir”, afirmou o dirigente. Uma dessas empresas foi a Latam.
Em sua visão, sempre haverá discussões sobre consolidação. A mais recente ocorreu entre Azul e Gol.
“Tem sido uma tendência nos últimos anos, vimos essas discussões em várias partes do mundo. É algo que está sendo continuamente monitorado e avaliado pelas companhias aéreas”, disse Cerdá.
“Mas isso não significa que teremos apenas fusões ou aquisições. O setor está sendo inovador e busca diferentes oportunidades de negócios para tornar suas operações mais fortes para competir no cenário global.”
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