Bloomberg Línea — O Gerente da Consultoria Agro do Itaú BBA, Cesar Castro Alves, disse na abertura de um evento em São Paulo na última semana que “não dava muito para fugir do tom de cautela dos últimos dois anos” quando o assunto é o agro como um todo.
Segundo Alves, mesmo com algum alívio proporcionado por tarifas que favoreceram a demanda externa por commodities brasileiras, ainda há turbulências no horizonte, como o encarecimento dos fertilizantes e o crédito que segue pressionado pelas taxas de dois dígitos.
Apesar dessas intempéries que marcam a atividade cíclica agrícola, Alves disse identificar nas proteínas animais mais um ciclo de bons resultados, com destaque para a suinocultura e a avicultura.
Leia também: Da carne aos grãos, Brasil e Argentina se beneficiam de guerra comercial de Trump
“O setor de proteínas é o vencedor nessa história toda”, afirmou o gerente de agro do Itaú BBA em entrevista à Bloomberg Línea.
A combinação entre “boa oferta de milho”, preços baixos de farelo de soja - que é utilizada na composição da ração animal - e uma estratégia de produção mais disciplinada tem garantido margens historicamente elevadas, especialmente na suinocultura, explicou Alves.
No caso dos suínos, o Brasil vive um momento de expansão acelerada das exportações, com um avanço de cerca de 15% no acumulado do ano e papel de destaque em novos mercados, como Filipinas, México, Chile e Vietnã.
“Historicamente, quando as margens ficam boas, o setor [da suinocultura] tende a aumentar a produção demais e perde o equilíbrio. Mas agora, mesmo com margens excelentes, a oferta está sob controle”, disse Castro.
A atividade do setor passou por um ganho de spread considerado considerável nos últimos anos: passou de 8% em média no segundo semestre de 2023 para 20% em 2024 e depois chegou a 23% no primeiro semestre de 2025, bem acima da média histórica desde 2016, que era de apenas 1%.
O spread calculado pela consultoria mede a diferença entre o preço do quilo do animal vivo e o custo de engorda, dividido pelo próprio preço.
Alves atribuiu o desempenho à maior resiliência das cooperativas, à saída de produtores menos estruturados e à capacidade do Brasil de diversificar mercados após a perda de relevância da China como principal destino das exportações.
Atualmente, cerca de 80% da produção de suínos é voltada ao mercado interno, mas as vendas externas têm ganhado participação e ajudado a sustentar a rentabilidade para a suinocultura.
Leia mais: JBS vê potencial de alta de 300% do capital com novo ciclo de expansão pós-NY
No meio do caminho, a gripe aviária
Na avicultura, o cenário também é considerado positivo, apesar de episódios recentes como o foco de gripe aviária inicialmente no Rio Grande do Sul.
A margem para o setor, que vinha em patamares acima da média histórica, caiu com a desvalorização do frango abatido no início do ano, mas já apresenta sinais de recuperação, segundo o relatório Visão Agro 2025/26, elaborado pela Consultoria Agro do Itaú BBA e divulgado na última sexta-feira (4).
“O segundo semestre deve ser melhor para a exportação, e o mercado interno também ajuda. Os alojamentos já estão diminuindo e o custo da ração caiu, o que sustenta as margens. Mesmo que o volume não bata novos recordes, as margens devem seguir saudáveis”, disse Alves.
Segundo o relatório da consultoria, a avicultura tende a manter margens operacionais saudáveis, a partir dos custos do setor, que estão mais sob controle, além da demanda global aquecida.
O Itaú BBA também projeta uma estabilidade sanitária do Brasil, após os focos de gripe aviária que foram identificados, o que também deve ajudar a favorecer as exportações no futuro. No final de junho, o Brasil se autodeclarou livre da doença.
Alves lembrou que as exportações para a China demoraram sete meses para voltarem no ano passado após o surto da doença de Newcastle. É um cenário que pode se repetir com a gripe aviária.
Leia também: Gripe aviária desafia o agro brasileiro e coloca em risco mercado de US$ 4 bilhões
“Penso que o setor [avícola] vai ser capaz de se planejar. A margem estava muito boa, mas tivemos uma queda de quase 20% que ocorreu no frango abatido, o que fez o patamar passar para a média", disse o gerente do Itaú BBA.
Ainda assim, uma sobreoferta pontual pode ocorrer de cortes menos consumidos no Brasil, como pés de frango, que são mais demandados pela China.
A carne bovina, por sua vez, continua beneficiada pela combinação de custos mais baixos e um ciclo pecuário favorável ao Brasil, em um contexto de queda de produção nos Estados Unidos e na Austrália.
No entanto o relatório da consultoria do Itaú BBA destaca que os spreads da indústria dependerão da manutenção de uma boa performance das exportações e da disciplina na gestão de custos.
“O alinhamento entre um ciclo de virada com oferta ainda elevada (mas em desaceleração) e uma demanda global firme, somada à queda da produção nos EUA, favorece o Brasil, que se beneficia tanto da necessidade de importação quanto dos altos preços da carne norte-americana, que ressaltam nossa competitividade”, avaliou o Itaú BBA no relatório.
A colheita de “milho safrinha”, maior do que o inicialmente projetado, e a oferta crescente de farelo de soja, impulsionada pelo avanço do esmagamento para produção de biodiesel, completam o cenário de custos mais construtivo para a produção animal.
Segundo o Itaú BBA, o etanol de milho e o DDG (subproduto da moagem) também vêm ganhando protagonismo e devem contribuir para a competitividade das proteínas.
Leia também
Marcos Molina: o self-made man por trás da nova gigante mundial de alimentos
Agricultores sul-africanos aceleram envios de cítricos aos EUA sob risco de tarifas
Plataforma que conecta investidor a projetos na natureza diz que Brasil é prioridade