A pedido de Lula, Haddad desiste de taxar produtos importados de asiáticos

Produtos negociados entre pessoas físicas no valor de até US$ 50 teriam que pagar 60% de imposto; medida gerou protestos e críticas em redes sociais

Xi Jinping e Lula durante a visita do brasileiro a Pequim no fim de semana, com as respectivas primeiras-damas
18 de Abril, 2023 | 05:44 PM

Bloomberg Línea — Depois de dias de pressão de varejistas asiáticas e de consumidores em redes sociais, o ministro Fernando Haddad, da Fazenda, decidiu recuar no fim da isenção da tributação a encomendas internacionais entre pessoas físicas no valor de até US$ 50 (cerca de R$ 250 na cotação atual). O Imposto de Importação é de 60% para compras em sites estrangeiros.

“O presidente [Lula] nos pediu ontem para tentar resolver isso do ponto de vista administrativo. Ou seja, coibir o contrabando. Nós sabemos aí que tem uma empresa que pratica essa concorrência desleal, prejudicando todas as demais empresas, tanto do comércio eletrônico quanto das lojas que estão abertas aí, sofrendo a concorrência desleal dessa empresa”, declarou o ministro da Fazenda a jornalistas nesta terça (18), segundo a Agência Brasil.

De olho em um potencial de arrecadação extra estimada em R$ 8 bilhões ao ano e em atendimento a uma reivindicação de longa data de varejistas brasileiras, sob alegação de concorrência desleal, o Ministério da Fazenda e a Receita Federal tinham anunciado há uma semana o fim da isenção do imposto de importação para encomendas de pessoas físicas de até US$ 50.

A medida afetaria as grandes empresas asiáticas do e-commerce que vendem no Brasil, como a Shopee, da Sea (SE), a Aliexpress, do Alibaba (BABA), e a Shein.

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Segundo acusações de varejistas brasileiras e da Receita Federal, tais empresas conseguem driblar a lei da tributação internacional enviando pacotes fracionados como se fossem pessoas físicas.

Haddad reiterou que o governo não vai mais tributar essas importações a pedido do presidente Lula. Em conversa com jornalistas, Haddad disse que o presidente da República pediu para que isso fosse resolvido do ponto de vista administrativo, com o aumento das fiscalizações.

“[O presidente Lula disse que] isso estava gerando confusão porque poderia prejudicar as pessoas que, de boa-fé, recebem encomendas do exterior até esse patamar, que é uma regra antiga”, disse Haddad, ainda de acordo com a Agência Brasil.

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Desde que a tributação foi anunciada, o governo petista foi criticado em redes sociais por usuários que não querem pagar impostos nessas compras e chegou até a acionar influenciadores apoiadores para explicar as razões para taxação das compras de até US$ 50, segundo a Folha de S.Paulo.

O recuo na decisão de tributação, que havia sido negado ontem (17) pelo secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, acontece dias depois de uma visita do presidente Lula à China, onde se encontrou com o presidente da segunda maior economia do mundo, Xi Jinping. Duas das maiores empresas que seriam afetadas com a tributação são da China, a Shein e a AliExpress.

As importações de produtos de pequeno valor atingiram US$ 1,5 bilhão nos primeiros dois meses de 2023, o maior valor registrado para o período nos últimos três anos, segundo dados do Banco Central mapeados pela Vixtra, fintech de comércio exterior.

Foco das empresas asiáticas no Brasil

O relatório Setores do E-commerce, da Conversion, estima que a Shein teve 69 milhões de acessos em fevereiro de 2023, contra 72 milhões da AliExpress e 138 milhões da Shopee.

A Shein é uma varejista chinesa que opera no modelo de fast fashion, ou seja, que produz coleções de roupas de baixo custo rapidamente em resposta às últimas tendências da moda. Em março, inaugurou uma loja física temporária em um shopping em Salvador, um dos principais mercados da empresa no Brasil.

A Shein disse que aposta no Brasil como um mercado estratégico na América Latina, onde a empresa tem visto um “crescimento exponencial”. A varejista já tinha feito uma iniciativa de lojas físicas temporárias no Rio de Janeiro e em São Paulo em 2022.

No final de janeiro, o marketplace anunciou a nomeação do ex-COO do SoftBank Marcelo Claure como presidente da Shein na América Latina. Claure supervisiona a estratégia da empresa na América Latina e assuntos de stakeholders na região e lidera a formação de um conselho consultivo para a América Latina. Ele também investiu US$ 100 milhões na varejista.

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O general manager da Shein no Brasil é Felipe Fistler, que, anteriormente, foi líder de e-commerce da concorrente asiática Shopee, de Singapura, para a América Latina.

Claure visitou o Brasil no mês passado, quando se encontrou com o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, além do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

A Shein diz ter escritórios globais e alcançar consumidores em mais de 150 países. A empresa anunciou nesta terça (18) a inauguração de seu primeiro escritório no Brasil, na avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, para “consolidar sua operação local e reforçar sua atuação no mercado nacional”.

Dados da SimilarWeb apresentados em relatório do BTG Pactual (BPAC11) mostram que, em fevereiro de 2023, a Shopee teve 11% da participação das visitas diárias aos websites, contra 23% da Amazon (AMZN) e 34% do Mercado Livre (MELI). Os brasileiros Magazine Luiza (MGLU3) e a Americanas (AMER3) tiveram, respectivamente, 14% e 6%.

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Segundo especialistas, se a fiscalização for exclusivamente para produtos importados, a medida poderia atingir mais o AliExpress e a Shein do que a Shopee, que disse ter mais de 3 milhões de vendedores brasileiros e que mais de 85% das vendas são de vendedores locais. “A Shopee apoia o empreendedorismo digital no Brasil e qualquer esforço que contribua para esse propósito”, disse a empresa em nota.

“Vamos continuar seguindo as leis e regulamentos locais e exigir que os vendedores da nossa plataforma também os cumpram. Queremos contribuir para o desenvolvimento do ecossistema no país”, disse a Shopee.

A AliExpress, que tem o Brasil entre seus cinco maiores mercados, tem feito o movimento de procurar atrair vendedores brasileiros, com vendas locais há um ano, mas o e-commerce entre fronteiras ainda é mais significativo para a plataforma chinesa.

Por meio de nota, a AliExpress disse que “manterá o compromisso de participar ativamente do desenvolvimento da economia digital brasileira”.

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“Acreditamos que o comércio internacional e o acesso a milhões de brasileiros, de diversos níveis de renda, diretamente a fabricantes do mundo todo é positivo a todos. Sempre estivemos em conformidade com as leis locais, fomos transparentes e vamos continuar disponíveis e colaborativos com o Governo e a Receita Federal do Brasil para trabalhar na melhor solução, considerando reconhecidas práticas internacionais em todo o mundo, a favor de quem mais importa, o consumidor brasileiro”, disse a empresa em comunicado.

A Bloomberg Línea também procurou a Shein, mas não obteve retorno.

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- Com informações da Agência Brasil.

-- Atualizado às 15:02 do dia 19/04 para adicionar posicionamento da AliExpress

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups