De ativos do metaverso ao colapso da FTX: a visão do BTG para crescer em cripto

André Portilho, head de Digital Assets do BTG, diz à Bloomberg Línea como o banco pretende pegar carona nas tecnologias do segmento e comenta as perdas de investidores

Sede do BTG Pactual: banco de investimento mantém planos de negociação de criptoativos apesar de virada do mercado
28 de Dezembro, 2022 | 04:18 AM

Bloomberg Línea — O colapso da exchange FTX representou novo revés para o mercado de criptoativos, inclusive no Brasil, e deve gerar mudança no comportamento de investidores, mas isso não mudou os planos do BTG Pactual (BPAC11) para o segmento. É o que afirmou André Portilho, head de Digital Assets do BTG, em entrevista para a Bloomberg Línea.

“O objetivo principal é trazer as temáticas importantes para a plataforma [Mynt, lançada em agosto passado], ou seja, os temas e as subindústrias que a tecnologia de cripto vai impactar. DeFi é uma, Web.3 é outra. Não adianta listar cem moedas que sejam lixo e não significam nada. O real impacto não estará representado na plataforma”, afirmou o executivo sobre a estratégia do banco.

O início de operação da Mynt pelo BTG se deu em um ano em que algumas das maiores instituições financeiras do país, especialmente as nativas digitais, aderiram à oferta de produtos com criptos. Foi o caso da XP (XP), do Mercado Pago - braço financeiro do Mercado Livre (MELI) - e do Nubank (NU).

O executivo do BTG Pactual disse que o mercado parece já ter absorvido o impacto negativo da quebra da FTX e deve engatar uma fase em que investidores devem priorizar intermediadores de negócios que ofereçam mais garantias de segurança e atendimento humanizado.

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Conhecido no Twitter por seus vídeos de educação financeira sobre criptoativos, Portilho apontou também o metaverso como outra aposta estratégica do BTG Pactual para o setor, com a atenção voltada para as principais redes de infraestrutura em expansão que viabilizam o novo ambiente digital.

“É uma questão geracional: seu filho ou filha entre 7 e 12 anos passa grande parte do tempo jogando Roblox, Fortnite e Fifa, interagindo com os amigos nesse mundo digital imersivo. É uma evolução da tecnologia, uma tese importante, que tem muito valor para ser gerado”, afirmou.

Colapso da FTX e de outras instituições deve mudar comportamento de investidoresdfd

Moedas digitais do metaverso

Para 2023, os planos da Mynt incluem a adição de novas moedas no app, que conta atualmente com dez ativos para negociações. Em dezembro, duas novas criptos começaram a ser disponibilizadas: SAND e MANA, ambas como moedas que são utilizadas em diferentes metaversos.

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A plataforma permite ainda a negociação de Chainlink (LINK), Polygon (MATIC), USDC, Bitcoin (BTC), Ether (ETH), Solana (SOL), Polkadot (DOT) e Cardano (ADA).

SAND é a criptomoeda do The Sandbox, projeto de metaverso que possibilita a criação de aplicações em terras virtuais comercializáveis. A tecnologia é baseada na rede de blockchain da Ethereum e Polygon. Com a SAND os jogadores podem comprar os ativos disponibilizados no ambiente virtual.

Depois da MANA, a SAND é o segundo maior projeto de metaverso em capitalização de mercado e volume de negociações. O modelo de negócio possibilita a criação de aplicações como games, exposições de NFTs e interações de usuários online.

Tecnologia vs. preços de mercado

O head de ativos digitais do BTG avaliou que, com regras definidas a partir da nova Lei de Criptoativos, o Brasil deve atrair mais investimentos, o que se traduzirá em desenvolvimento acelerado da tecnologia. Ele não quis abrir números sobre a operação do banco nessa área, mas disse que a base de investidores nesse mercado no Brasil está crescente, em referência a dados recentes da Receita Federal.

Na sua avaliação, a repercussão negativa do caso FTX e de outros episódios do setor, como a quebra de Terra/Luna em maio e da Three Arrows Capital e da Celsius Network em junho, não deveria ofuscar o avanço da tecnologia promovido por desenvolvedores em 2022, como o a atualização da rede Ethereum.

Confira a entrevista com o head de Digital Assets do BTG Pactual, editada para fins de clareza.

O senhor enxerga algum risco de contágio do caso FTX para o mercado no Brasil, de instituições expostas ao colapso da exchange?

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O mercado já seguiu em frente. Óbvio que fica suscetível e que pode ter algum efeito de segunda ordem, que ainda não apareceu, um cadáver que ainda vai boiar, mas acho que o pior já ficou para trás. O primeiro e mais forte impacto da FTX já aconteceu. Olhando a queda de valor do mercado cripto, o impacto da FTX foi menor do que o de Terra/Luna em maio e o da Three Arrows Capital e da Celsius em junho.

Há o risco de o novo governo apertar a regulação do mercado de criptoativos?

Vou responder como um brasileiro: não vejo risco de mudança, dada a agenda do Banco Central, da independência do BC. Agora, risco no Brasil sempre tem. No Brasil, até o passado é incerto, que é uma frase do Roberto Campos [ex-ministro do Planejamento entre 1964 e 1967].

O Banco Central tem o projeto do real digital. Como isso se encaixa na plataforma de ativos virtuais do BTG?

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O timing dessa implantação vai depender muito de tecnologia, o quão rápido o BC consegue colocar essa agenda para frente, de recursos e do quanto o mercado vai absorver. O real digital é só uma parte dessa visão mais ampla do Roberto Campos Neto, presidente do BC, que inclui ainda o Pix [meio de pagamento instantâneo] e o Open Finance [sistema de compartilhamento de dados bancários].

Nem os mais otimistas do BC imaginavam que a adoção do Pix pela sociedade seria tão rápida. No fim das contas, tudo isso vai levar a uma mudança na infraestrutura da indústria financeira, se modernizando para um mundo digital. Isso pode trazer mais impacto e benefícios para a sociedade.

A Mynt adicionou novas moedas em seu app, que considera o potencial das plataformas de metaverso. Em 2022, a narrativa da Meta sobre esse mercado foi questionada. O debate sobre o metaverso ficou viciado?

Não diria que está viciado. Toda tecnologia nova tem esse momento de hype. A inteligência artificial já passou por cinco ondas de hype. As pessoas não têm ainda uma visão correta sobre o metaverso. Não é só sentar em uma sala usando óculos e luvas. Há todos esses ambientes imersivos digitais, como ambientes de jogos. É uma evolução da tecnologia. É uma tese importante, há valor para ser gerado.

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Se você tem um filho ou filha entre 7 e 12 anos, garanto que eles passam grande parte do tempo no metaverso. Não é o de 3D, mas eles estão jogando Roblox, Fortnite, Fifa e interagem com os amigos num ambiente digital. É uma questão muito geracional.

Os bancos digitais se dividem sobre o mercado de criptoativos no Brasil. O Nubank começou a oferecer a negociação de bitcoin e ether. Já o C6 Bank evita entrar no segmento. Como o senhor avalia essa divisão entre as instituições?

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Começamos isso há bastante tempo, em 2017. Lançamos tokenização em 2019. No ano passado, lançamos os primeiros fundos de cripto geridos pelo próprio banco. Neste ano, lançamos a Mynt. O fato de outras instituições estarem vindo para o mercado corrobora nossa visão e nossa tese e ajuda a aumentar o mercado, que tem muito para crescer.

Cada instituição vai ter diferentes visões e modelos de negócio, que são complementares em alguns aspectos e concorrentes em outras. Temos tecnologia própria e acreditamos que isso seja um diferencial, pois imaginamos um grau de transformação que a tecnologia cripto vai ter no mercado.

Outros optaram por fazer [a plataforma] com terceiros para crescer mais rápido. São modelos de negócio diferentes. O tempo vai dizer qual é o melhor e o pior modelo.

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O que o BTG planeja para a plataforma Mynt em 2023?

Teremos mais listagem de criptoativos ao longo do ano. Não sabemos ainda quantas. Hoje conseguimos ter uma cobertura boa do mercado. Tudo isso depende de demanda de cliente. Fazemos uma apuração: se um setor pode ser impactado pela tecnologia, é importante estar representado pela plataforma. Vai ter muita novidade.

Além disso, temos a parte do fan pass. Fechamos um acordo com o Grêmio para trazer o fan token, que chamamos de fan pass. É uma ferramenta poderosa de interação do clube com os torcedores.

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O detentor do fan token ou fan pass vai ter experiências únicas. Isso é muito bom para o engajamento do torcedor, pois traz esse ecossistema de patrocinador do clube para o fã.

Há casos de investidores traumatizados com o colapso da FTX e as perdas que tiveram em 2022 com a queda nos preços. Como reverter essa percepção negativa do investidor?

Óbvio que eventos de insegurança freiam um pouco essa aceleração do mercado. Na minha percepção, mesmo com esse ambiente mais inseguro, com a sensação de mais volatilidade, o interesse continua crescente nas pessoas que querem entender mais sobre a tecnologia, entender como a evolução dessa tecnologia impacta preço de mercado, o que pode ser um investimento ou não. Tenho essa percepção pelas conversas que tenho com nossos canais de distribuição, com diversos tipos de clientes.

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O mercado de cripto já vem caindo das máximas desde novembro de 2021. Esse primeiro movimento veio muito ligado aos fatores macroeconômicos, principalmente com um início do aperto monetário nos Estados Unidos, que emitem a moeda mundial. Quando ele aperta a política monetária, todo mundo sofre. E os que mais sofrem são os ativos de risco.

Esse primeiro momento foi muito correlacionado com o movimento de ações de tecnologia, principalmente nos EUA. Quando se compara o bitcoin e o ethereum com a bolsa americana, o S&P 500, o Nasdaq, o bitcoin caiu mais do que esses índices de bolsa.

Quando se compara com as ações de tecnologia, excluindo as de companhias mais maduras como Apple e Microsoft, mas olhando para Zoom, Netflix e Peloton, tudo caiu na mesma magnitude.

Há também muita especulação no mercado de criptoativos.

A especulação faz parte do jogo de todos os mercados, de ações, de renda fixa. O mercado de cripto, como é um ambiente ainda menos regulado, global, que tem características diferentes do mercado tradicional, há, sim, muita especulação. Mas há também especulação em bolsa, em renda fixa, lembra do GameStop? Aquilo foi uma especulação da mesma magnitude como acontece em cripto.

O problema aqui é o comportamento humano. Há lacunas na educação financeira de muitos investidores. Não se analisam os ativos na perspectiva de médio e longo prazo. Muitas pessoas seguem o caminho errado no processo de decisão sobre onde alocar seus recursos. Nossa plataforma não promete que o investidor vai ficar milionário do dia para a noite.

Em contrapartida aos colapsos, é bom destacar também que houve coisas positivas: muito desenvolvimento interessante da tecnologia. A principal foi a da rede do ethereum, que mudou completamente sua dinâmica. E o desenvolvimento de muitas redes que são acessórias do ethereum.

Ou seja, tivemos um mercado muito negativo, mas, na parte da tecnologia, houve muita evolução ao longo deste ano. É muito importante separar: o mercado é uma coisa, a tecnologia é outra.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.