Santander Brasil volta a mirar varejo de ‘massa’ e quer atrair clientes inativos

Após controlar a inadimplência, banco espanhol adota estratégia voltada para clientes com renda mensal de até R$ 4.000 e busca usar o Pix como um dos meios de atração

Banco prevê retomada gradual da rentabilidade após controle da inadimplência
30 de Abril, 2024 | 03:39 PM

Bloomberg Línea — O Santander Brasil (SANB11) iniciou uma ofensiva para recuperar clientes inativos - além de atrair novos correntistas -, com o objetivo de se expandir novamente no segmento “massificado” de varejo. O movimento ocorre em meio à melhora relativa dos índices de inadimplência e do endividamento das famílias, que vinham pressionando os resultados de bancos brasileiros nos últimos anos.

A nova estratégia da operação do banco espanhol tem como foco o uso crescente da chave Pix (que dá acesso às transações feitas nesse meio instantâneo de pagamento), para recuperar seu nível histórico de rentabilidade e reconquistar o segmento de baixa renda.

Entre as principais medidas está um redesenho da prateleira de produtos, agora voltada principalmente para brasileiros de menor patrimônio, e o lançamento recente de uma campanha para promover a conta corrente e o cartão Free.

Durante teleconferência com analistas nesta terça-feira (30), o CEO do Santander Brasil, Mario Leão, descreveu a estratégia como um reposicionamento com foco no público com renda de até R$ 4.000 mensais e em apelos como ausência de anuidade do cartão de crédito e uso do Pix.

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A nova estratégia foi o tema dominante dos questionamentos de analistas do mercado que participaram da conversa com executivos do banco. Das nove perguntas realizadas, somente uma foi sobre inadimplência - assunto que havia predominado nas teleconferências de resultados anteriores.

“É uma volta ao ‘mar aberto’?”, questionou o chefe de research da corretora Genial, Eduardo Nishio, durante a teleconferência, fazendo referência ao segmento de clientes capturados na internet, sem vínculo anterior com o banco, justamente o que protagonizou a crise recente de inadimplência do setor.

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Em resposta, Leão admitiu que a nova estratégia para o varejo massificado reflete um maior apetite ao risco, buscando clientes que deixaram de realizar suas transações ou nunca tiveram conta no banco, para aproveitar o novo momento econômico, em que o mercado de trabalho está aquecido e o consumo apresenta sinais de melhora.

“Vimos que, dos 60 milhões de clientes, metade, 30 milhões, era inativo. Queremos trazer de volta esse cliente, mas o mar aberto está diferente, não é o mesmo de 2021. Hoje esse cliente é mais qualificado. Usamos mais dados para entendê-lo, é mais seguro do que no passado”, afirmou o CEO.

No início de fevereiro, Leão já falava que uma das prioridades de 2024 era simplificar a oferta de produtos e avançar na operação digital, a fim de melhorar a rentabilidade do segmento massificado de varejo.

O movimento foi construído com mudanças internas, como a chegada de uma nova CMO, Juliana Cury (ex-Zamp e Itaú Unibanco), anunciada ainda em fevereiro, logo após a divulgação do balanço de 2023.

A aposta no Free deslancha após o Santander Brasil avaliar que a inadimplência está hoje sob controle, após o Banco Central ter iniciado um ciclo de cortes na taxa Selic em agosto de 2023. O juro básico está hoje em 10,75% ao ano, o menor nível desde março de 2022, após os 13,75% vigentes por um ano (entre agosto de 2022 e agosto de 2023).

A melhora das perspectivas de juros também se refletiu no resultado do primeiro trimestre. A operação do banco espanhol no país registrou um lucro líquido de R$ 3 bilhões (alta de 41% em 12 meses) e uma rentabilidade de 14%, ainda longe do nível anterior à piora da qualidade do crédito (20%).

Desde o segundo trimestre de 2022, o Santander Brasil só reportava lucro trimestral abaixo da marca de R$ 3 bilhões. Nessa época, um dos principais “detratores” dos balanços era a piora da qualidade do crédito que atingiu todo o setor bancário no contexto de inflação e juros elevados e o consequente endividamento das famílias.

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“O mercado aprendeu de forma dura que concedeu crédito além do que os clientes eram capazes de absorver. Hoje temos um entendimento melhor, um amadurecimento, sobre a pouca elasticidade da baixa renda. Temos uma proposta nova, mais segura, para ofertar crédito para o segmento massificado de varejo”, disse Leão.

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Gustavo Alejo, CFO do Santander Brasil, buscou tranquilizar os analistas sobre os riscos de um novo repique da inadimplência, dizendo que houve uma melhora das provisões para devedores duvidosos (PDD) mesmo com a retomada do aumento nas emissões de cartões de crédito.

“Os índices de inadimplência estão controlados, com destaque para a performance em pessoa física. A perspectiva do custo de crédito para 2024 é positiva”, afirmou Alejo.

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Ele disse que a rentabilidade do primeiro trimestre (14%), medida pelo ROE (retorno sobre o patrimônio líquido), deverá apresentar uma retomada gradual nos próximos trimestres com o desenvolvimento de uma base mais estável de clientes e com a melhora da margem financeira. Será reflexo da evolução positiva dos spreads e o crescimento da carteira de crédito, principalmente no segmento PF e no financiamento de consumo, além do aumento das captações e das comissões.

Caça à chave Pix e crescimento em cartões

A popularização do Pix, lançado pelo BC em novembro de 2020, compõe o pano de fundo da estratégia do Santander com a conta e cartão Free em sua nova tentativa de expandir a base de clientes sem alimentar uma nova crise de inadimplência.

Como brasileiros abrem até cinco contas digitais, devido à facilidade do cadastro online, os bancos disputam a preferência desses clientes na hora do cadastro da chamada “chave Pix” (como número do CPF, cadastro de pessoa física, do celular ou e-mail), exigida para enviar, receber ou cobrar recursos.

Os usuários do Pix podem levar a chave registrada de um banco para outro. Em 2023, o Pix foi confirmado como o meio de pagamento mais popular do país com quase 42 bilhões de transações, uma alta anual de 75%, segundo estudo da Febraban (Federação Brasileira de Bancos).

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No caso do Free, o banco vai oferecer ao cliente que cadastrar o CPF ou o celular como chave Pix um benefício de dez dias sem juro no limite da conta, além de saques ilimitados nos caixas do Santander e da Rede 24h e isenção da cobrança de anuidade do cartão.

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O Santander disse ter ouvido mais de 1.000 correntistas, incluindo de outras instituições, para chegar a esse pacote de benefícios e desenhar o segmento Free.

A pesquisa apontou as razões para a abertura de conta, das quais a principal (15,1%) é a gratuidade de conta e do cartão, seguida pelos benefícios (11,2%). No uso do cartão de crédito, 38,8% das respostas apontaram a possibilidade de “resolver tudo pelo app” e o limite para gastos (37,1%).

Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.